<% pagina = "http://" & request.ServerVariables("HTTP_HOST") & request.ServerVariables("URL") %> Ciência & Comunicação - Comunicações
Volume 3
Número 5

20 de dezembro de 2006
 
 * Edição atual    

          A divulgação da pesquisa científica no Brasil

Marcelo Pompêo*

            Resumo

            A crescente orientação para a publicação em revistas internacionais vem acompanhando a mudança no critério de avaliação do mérito da pesquisa científica no Brasil. O modelo vigente privilegia a publicação em revistas estrangeiras e no idioma inglês, consideradas de maior relevância técnica e de maior nível de impacto na comunidade científica, em detrimento das revistas nacionais e de escrita em português. Menor importância ainda é dada às publicações de divulgação científica. A continuidade na discussão preferencial de preocupações de caráter externo e a falta de motivação para publicar textos em revistas especializadas nacionais e artigos de divulgação científica, não permitirão elevar o nível educacional e conscientizar a população. O modelo adotado pelas agências de fomento à pesquisa no Brasil, contribuirá para reduzir o número de títulos de revistas científicas nacionais e sua qualidade, e inibirá o amplo debate sobre questões de caráter local.

            Palavras-chave: divulgação científica, revistas científicas, agências de fomento.

            Introdução

            As descobertas da ciência geram novos conhecimentos, à medida que permitem a compreensão dos fenômenos da natureza e fornecem alternativas para o aproveitamento sustentável dos recursos e contribuem para a melhoria da qualidade de vida da sociedade contemporânea.

            Etapa de fundamental importância para a pesquisa científica, a divulgação do novo conhecimento é proporcionada pela publicação de artigos em revistas técnicas especializadas. O julgamento da novidade e importância do novo conhecimento gerado é realizado por pesquisadores que estudam a particular área de interesse.

            A divulgação da pesquisa científica

            A publicação da pesquisa científica em revistas especializadas, de formato e normas rígidas e bem estabelecidas, atende às necessidades da pesquisa e permite a troca de experiências entre os pesquisadores. No entanto, estas revistas científicas especializadas têm formato e vocabulário pouco familiar ao cidadão leigo, sendo que apenas pequena parcela da população brasileira tem acesso integral ao seu conteúdo.

            Existem inúmeras revistas científicas de alto nível no Brasil, publicando há muitos anos as pesquisas desenvolvidas por grupos de pesquisadores brasileiros e, em sua grande maioria, relacionadas a temas de interesse nacional.

            O simples fato de o artigo científico discorrer sobre questões de caráter local, contribui para a disseminação do conhecimento para um maior número de brasileiros e permite incluir discussões que vislumbrem a solução dos inúmeros problemas nacionais. Portanto, a existência de sólidas revistas científicas editadas no Brasil, que publiquem textos escritos inclusive em português, tem caráter estratégico.

            Nos últimos anos, a crescente orientação de pesquisadores brasileiros para publicar em revistas técnicas internacionais vem acompanhando a mudança no critério de avaliação do mérito da pesquisa científica no Brasil. O modelo de divulgação das pesquisas científicas vigente cada vez mais privilegia a publicação em revistas estrangeiras e no idioma inglês, consideradas de maior relevância técnica e de maior nível de impacto na comunidade científica, em detrimento das revistas nacionais e de escrita em português, em sua grande maioria considerada de penetração restrita. Desta forma, na atualidade, o veículo de divulgação empregado, e não unicamente a qualidade da pesquisa executada, assume relevante papel na avaliação da pesquisa e, consequentemente, do pesquisador e de sua equipe de colaboradores. O simples fato da publicação do manuscrito se dar em periódico de alto impacto confere mérito à pesquisa.

            Para ter o artigo aceito para publicação em revista internacional, não basta unicamente ter trabalho científico de qualidade, a pesquisa tem também que atender a critérios de competência estabelecidos pelas comissões editoriais dos respectivos periódicos. Como regra básica, tema de interesse local não costuma ser prioritário para a comunidade científica internacional; desta forma, a pesquisa de caráter local é pouco divulgada no cenário internacional. Assim, o pesquisador que se dedica a temas de interesse regional publica em revistas de menor impacto. Desta maneira, tende a ter menor prestígio da comunidade científica brasileira e, consequentemente, menos verbas das agências de fomento, do que aquele cuja linha de pesquisa atende à demanda para publicação em revistas estrangeiras de alto impacto.

            Menor importância ainda é dada à publicação de textos mais abrangentes e que atingem maior parcela da população, publicados em revistas de caráter informativo, como os textos de divulgação científica. Textos voltados ao público não especializado, traduzindo de forma clara e objetiva a informação contida na revista técnica especializada, assumem relevante papel na divulgação da ciência, contribuindo para a educação e formação de recursos humanos. Apesar dessa importância, a sua publicação não recebe o devido apoio dos pesquisadores e valorização das agências de fomento à pesquisa no Brasil, sendo poucos aqueles que dedicam parte de seu tempo na geração de publicações dessa natureza.

            A maioria dos pesquisadores encontra-se em institutos de pesquisa e universidades públicas no Brasil. O financiamento das pesquisas e os respectivos salários dos pesquisadores, na sua maior parcela, são provenientes do conjunto de impostos pagos pelo cidadão. Esta característica pública de financiamento reforça que a redação do artigo científico não deve ser o objetivo em si da pesquisa científica e a pesquisa não deve atender exclusivamente ao interesse do pesquisador, ou dos editores de revistas técnicas internacionais. Além do mais, a divulgação do conhecimento não deve ficar restrita aos relatórios técnicos e periódicos especializados, de formato e vocabulário pouco acessível, particularmente se escritos em língua estrangeira. Tão importante quanto a publicação do artigo científico, como etapa fundamental da pesquisa científica, a publicação de textos para jornais de divulgação deve ser valorizada. Em especial a divulgação da ciência por meios mais ágeis e diversificados, como permitido pela Internet, aproxima o público do conhecimento recente. A estrutura livre desses textos modifica a forma do manuscrito, com a potencialidade de informar com maior alcance, auxiliando a formar cidadãos mais conscientes da sua ação como agente modificador do meio. Além disso, cabe salientar a importância de se formar os cidadãos em temas de ciência, uma vez que, por depender de financiamento público, a atividade científica passa, direta ou indiretamente, também a depender, cada dia mais, do posicionamento crítico e da aprovação da sociedade. Educar para a Ciência, através de instrumentos como a divulgação científica, garante o estímulo à formação de novas gerações de pesquisadores. Garante também a aceitação e, portanto, a sobrevivência no longo prazo da atividade científica. Mais e mais os cidadãos serão instigados a opinar (e aprovar o financiamento) de certas linhas de pesquisa. Os cientistas, por sua vez, estão, também, cada vez mais obrigados a justificar o seu fazer e a contribuir na formação (e informação) dos cidadãos em Ciência.

            Considerações finais

            A continuidade na discussão preferencial de preocupações de caráter externo e a falta de motivação para publicar textos em revistas especializadas nacionais e artigos de divulgação científica, refletirão no nível educacional e de conscientização da população brasileira, inclusive comprometendo a formação de novos pesquisadores. O modelo adotado pelas agências de fomento à pesquisa no Brasil, privilegiando textos publicados em revistas científicas internacionais, contribuirá para reduzir o número de títulos de revistas científicas nacionais e sua qualidade. Também inibirá o amplo debate sobre importantes questões de caráter local. Além disso, continuar-se-á a incorrer no erro de negligenciar a divulgação científica como poderoso instrumento de informação e formação de cidadãos realmente críticos e participativos.

            Agradecimentos

            Ao Grupo de Pesquisa em Limnologia (USP, IB, Depto. de Ecologia), a Lighia B. Horodynski Matsushigue (IF, USP), ao Sérgio Tadeu Meirelles (IB, USP), a Vera Rita da Costa (Ciência Hoje - SP) e Viviane Moschini Carlos (UNESP, Sorocaba, SP) pelas valiosas sugestões apresentadas ao manuscrito.

 

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Marcelo Pompêo
Biólogo, doutor, professor do Departamento de Ecologia/IB, Universidade de São Paulo.

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