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O
lado negativo dos cadernos de ciência
Durante
algum tempo, defendi a existência de cadernos de ciência
e tecnologia em nossos jornais e cheguei a festejar, inclusive,
a implementação de alguns deles como sinal de que
o Jornalismo Científico finalmente havia merecido o reconhecimento
de empresários da comunicação e de editores.
Mas esse tempo passou e o "boom" prometido não
se efetivou. Alguns veículos de prestígio fecharam
os seus cadernos (como a Folha de S. Paulo) e outros sequer cogitaram
de abri-los, ainda que fosse essa a minha expectativa.
Hoje,
poucos, bem poucos, veículos dispõem de cadernos
específicos de ciência e tecnologia ou mesmo editorias
especializadas nessa cobertura. O fenômeno chamou a minha
atenção e exigiu uma análise mais detalhada.
Se é verdade (todo mundo repete isso a cada momento) que
a ciência e a tecnologia são, hoje, as mercadorias
mais valiosas, se é verdade que a ciência e a tecnologia
freqüentam o dia-a-dia dos cidadãos, então
por que os meios de comunicação não lhes
dedicam maior tempo e espaço? E por que, a não ser
em poucos casos, essa cobertura continua sendo pouco qualificada?
Por que a ciência e a tecnologia, em sua dimensão
mais ampla, não integra o "núcleo duro"
da cobertura da mídia?
Na
prática, há muitas razões pelas quais a ciência
ainda não ganhou definitivamente status na imprensa nacional.
A mais significativa é mesmo a falta de consciência
dos donos da mídia e de editores que só contemplam
a área quando há fatos sensacionais e, salvo honrosas
exceções, vêem meteoros ameaçando o
planeta todo dia, revelam sucessivas curas milagrosas do câncer
ou confundem pseudociência com coisa séria. Podemos
admitir que o analfabetismo científico dos leitores , telespectadores
ou radiouvintes também contribui para essa timidez de cobertura
e que a isso se agrega a inexistência de profissionais capacitados
para dar conta de um espaço maior.
Mas
o que interessa aqui é desmistificar a tese dos cadernos
de ciência e de tecnologia. Assim como o meio ambiente e
a educação, a ciência e a tecnlogia deveriam,
estar nos veículos a partir de uma perspectiva transversal.
Ou seja, não segregadas necessariamente em espaços
fixos (que deveriam ser reservados apenas para coberturas especiais)
, mas integrar o quotidiano das pautas jornalísticas.
A
ciência e a tecnologia deveriam estar na Política,
nas Cidades, na Educação, no Agribusiness, no Esportes,
na Economia, enfim deveriam respaldar matérias que exigem
ou prescindem deste olhar e deste conhecimento. Se essa fosse
a realidade hoje, teríamos tido uma melhor cobertura do
acidente do Metrô paulistano, teríamos uma explicação
menos esotérica do rompimento da barragem da Cataguazes
ou ainda informações mais consistentes sobre o controle
do tráfego áreo no Brasil e mesmo sobre a explosão
da unidade Tamaron da Bayer.
Por
não assumir esta perspectiva lógica e racional (por
que não cética?), por não recorrer às
fontes especializadas (particularmente as independentes) e sobretudo
não praticar esse olhar investigativo, que transcende a
mera divulgação dos fatos, o Jornalismo Científico
acaba ficando reduzido a matérias muitas vezes insossas
nas poucas páginas e cadernos de ciência e tecnlogia
e não agrega qualidade à informação
jornalística diária (ou instântanea no caso
do jornalismo on line).
Talvez,
pensando bem, a idéia de cadernos de ciência e tecnologia
mais contribui para esvaziar a área do que para enriquecê-la,
já que torna a cobertura um fato singular, certamente excluindo
a leitura e a audiência de milhões de brasileiros.
Em vez de criarmos mais cadernos e esperarmos que apareçam
interessados, é mais razoável incluirmos este olhar
nas matérias em geral que estamos produzindo e irmos buscar
o leitor, o radiouvinte e o telespectador em qualquer lugar.
A
ciência e a tecnologia precisam ser retiradas destes nichos
e contaminar toda a cobertura. O Jornalismo Científico
não pode cultivar seus quetos mas dialogar com toda a redação.
Especializado sim, mas segregado não.
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