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O alcoolismo no universo Teen e a informação que é veiculada nos suplementos para jovens

Aparecida Ribeiro dos Santos e Babette de Almeida Prado Mendoza*

"Mesmo para os que, entre nós, consideram-se crescidos,
pensar sobre adolescência, envolve pensar sobre nós
mesmos: sobre o que éramos e somos, sobre o que
poderíamos ter sido, sobre o que esperamos ser"
Isolda de Araújo Günther

      RESUMO

      Vivemos sob a "égide da informação", portanto,parece-nos estranho falarmos da falta de informação sobre os males que a bebidaalcóolica causa tanto para quem bebe quanto para quem convive com o adido. Seriam osadolescentes realmente mal informados? Ou o problema residiria não na falta deinformação ,somente, mas nas formas discursivas como são veiculados o saber, a culturae a própria informação a esse público jovem? Será que há o respeito por parte damídia, de educadores de entender essa faixa etária com seus ídolos, símbolos, idéiase linguagem inovadoras, que são seres que vivem um momento único, e portanto,angustiante, conflitante na sua busca de uma identidade social- política ecomportamental?
      Essas são algumas das questões que procuraremos atingir através deum estudo do Pr. Dr. JACQUES VIGNERON (UMESP) e levantamentos sobre os suplementos parajovens veiculados nos jornais diários, realizado por MARIA CRISTINA GOBBI (doutoranda daUMESP) e pela ANDI (Agência de Notícias dos Direitos da Infância).

      Palavras-chaves: comunicação, suplemento juvenil, alcoolismo.

      INTRODUÇÃO

      A comunicação em suas mais variadas matizes insere-se numprocesso contínuo de disseminação do saber, da informação e da conscientização daspessoas:enquanto seres sociais, políticos e históricos. Portanto, deve fazer-se presentenas discussões tangentes às problemáticas de nossa sociedade,como o alcoolismo, quenão é um assunto só do Brasil, mas de âmbito mundial, porém no Brasil assume umaspecto diferenciado de outros países, pois como as nossas leis vigentes a respeito deconsumo e venda de álcool para adolescentes são ineficazes, delineia-se um quadrobastante caótico e preocupante frente ao crescente alcoolismo juvenil.
      Interessante notar que em estudos desenvolvidos, como o do ProjetoConhecer de um colégio de ensino médio, revela-nos que dentre as opções de lazertemos em primeiro lugar a música, em segundo a TV e em terceiro o bate-papo com oscolegas. O consumo de bebida alcoólica é uma opção de lazer que pode facilmente seraliada às outras opções. Existe claramente uma "cultura" de que os encontrostêm de ser regados com bebidas alcoólicas, pelo seu caráter transgressor que atrai osjovens e por ser um desinibidor que "abre portas" e integra o indivíduo aogrupo, como se fosse um ritual de iniciação.
      Sabemos que hoje o adolescente é alvo de muitas publicações quetratam dos mais diversos temas como música, sexualidade, comportamento, etc. Há jornaisde grande circulação que encartam semanalmente um suplemento destinado a esse público.As drogas ilícitas estão incluídas na lista de temas abordados para tal segmento..Resta-nos saber se o abuso de bebida alcóolica é abordado nesses suplementos e com quelinguagem, ou seja de que maneira se faz uso desse veículo para fins de prevenção aoalcoolismo juvenil.
      Há um mascaramento , uma dissimulação velada a respeito da drogalícita- o álcool- reforçado por um ritual de apoio ao primeiro porre e posteriormente o: beber socialmente. Não se vêem campanhas contra o álcool nas escolas, universidades, equando ocorrem como no período do carnaval enfatiza-se o perigo de dirigir alcoolizado-"você pode beber desde queoutra pessoa dirija"- é sempre o estímulo ao atode beber. Chega-se ao ponto de usar como estratégia um comportamento seguro para venderbebida alcóolica, esse é o caso do anúncio em outdoor de uma cachaça muitoconhecida: "Usar cinto de segurança é uma Boa Idéia".
      Para a professora do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP,BEATRIZ CARLINI COTRIM, o consumo de álcool aumentou entre os jovens e os pais nãoimpõem proibições e limites aos filhos: "A sociedade ficou traumatizada com aditadura e hoje tem dificuldades para estabelecer certas normas" (site sobrealcoolismo).
      Enfim, os pais deveriam se conscientizar que o álcool já é avaliadocomo a real "porta de entrada" para o mundo das drogas e os jovens precisam serorientados a adotar um estilo de vida com menos riscos e um cuidado especial com a saúde.
      Esse trabalho pretende atingir a cultura do uso da bebida alcóolica nouniverso do jovem através do discurso de adidos jovens em recuperação de um grupo deAlcóolicos Anônimos e a abordagem do tema em suplementos para jovens que circulam emgrandes jornais do Brasil.

      FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

      As estatísticas mostram que o álcool , é de longe, a maisperigosa das drogas, responsável por 90% das internações em hospitais psiquiátricos,responsável, ainda, por 45% dos acidentes com jovens entre 13 e 19 anos e por 65% dosacidentes fatais. Provocando 350 tipos de doenças físicas ou psíquicas (www.aprendiz.com.br) . Portanto não hánecessidade de ser um matemático para que se perceba o engano ao afirmar-se que osviciados em drogas lícitas também representam um caso grave de saúde pública.
      O Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas (CEBRID) diz que de15.503 estudantes entrevistados nas capitais do país, 53,2% consomem álcool e 6% sãodependentes. Depois de beber, 11% envolvem-se em brigas e 19% faltam à escola (www.terra.com.br/istoe).
      Em outra pesquisa do CEBRID, publicada na Folha de São Paulo, apontaque a faixa etária que apresenta maior índice de dependência de álcool entre homens(18,2%) é a de 18 a 24 anos. Essa é a idade que "vê menos risco em tomar um oudois drinks por semana: 39,6% contra 42,2% em média" (IZIDORO - Folha de SãoPaulo).
      O consumo de bebidas alcoólicas é tão comum que muitas pessoas nãoimaginam que elas são drogas potentes. A relação entre álcool e câncer tem sidoavaliada, no Brasil, por meio de estudos de caso-controle, que estabelecem a associaçãoepidemiológica entre o consumo de álcool e canceres da cavidade bucal e de esôfago.Além de agente causal de cirrose hepática, em interação com outros fatores de risco,como, por exemplo, o vírus da hepatite B, o alcoolismo está relacionado a 2 - 4% dasmortes por câncer, implicado que está, também, na gênese dos canceres de fígado, retoe, possivelmente mama. Os estudos epidemiológicos têm demonstrado que o tipo de bebida(cerveja, vinho, cachaça, etc.) é indiferente, pois parece ser o etanol, propriamente, oagente agressor. Essa substância psicoativa tem a capacidade de produzir alteração nosistema nervoso central, podendo modificar o comportamento dos indivíduos que dela fazemuso. Por ter efeito prazeroso, induz à repetição e, assim, àdependência.(www.inca.org.br)
      Esse aspecto endêmico tende a piorar se pensarmos que:
      O álcool fazparte de um mundo simbólico, bacaniano deiniciação à vida adulta, sendo estimulado até em momentos ditos familiares como festasinfantis, quermesses de igreja, natal. E o que dizer em festas de caráter profano como ocarnaval.
      O estímulo está em toda a parte na televisão com os anúnciosdas famigeradas cervejas- há até o dia da cerveja- em outdoors, revistas,músicas. É o poder do dinheiro , do patrocínio das cervejarias em eventos culturais ,esportivos- é o paradoxo do paradoxo. Segundo Dra. COTRIM, "o marketing hoje évoltado para conquistar um público jovem" (FORMENTI).
      O álcool é a droga que mais vicia no mundo, em termos de número depessoas viciadas a substância é livremente anunciada em toda a mídia: rádios,televisão, revistas. E o que nos parece mais importante:
       É exibida como um troféu, parte essencial dos momentosde prazer, vinculada à sucessos financeiros e acertadas decisões. O álcool é um grandenegócio, a receita dessa indústria gera milhões anuais no Brasil e a partir domarketing cria-se imagens sedutoras, procurando encobrir os efeitos destruidores que oalto e freqüente consumo trazem.
      A partir de um projeto do Prof. Dr. VIGNERON da Universidade Metodistade São Paulo "O papel da comunicação na prevenção do alcoolismo juvenil narecuperação dos sujeitos alcoólicos jovens no contexto das organizaçõeseducacionais" analisar-se-á o papel da comunicação na prevenção doalcoolismo juvenil, assim como, assertivas sobre o assunto em questão.
      Faz-se necessário definir-se o alcoolismo. Para o leigo é umvício, palavra preconceituosa que provocaa rejeição do sujeitoalcóolico.O verbete – do Dicionário Aurélio - vício tem uma conotação negativa muitoforte; para comprovar este fato basta ler as definições propostas pelo dicionário dalíngua portuguesa: "

1- Defeito grave que torna uma pessoa ou coisa inadequadapara certos fins ou funções.
2- Inclinação para o mal ( nesta acepção , opõe-se avirtude.
3- Costume de proceder mal; desregramento habitual.
4- Conduta ou costumecensurável ou condenável; libertinagem, licenciosidade, devassidão.
5- Qualquerdeformação física ou funcional.
6- Costume prejudicial"1

      Quando se fala de alcoolismo , esta carga negativa é muito forte eaumenta o grau de rejeição do sujeito alcoólico.
      As associações que trabalham na prevenção do alcoolismo e narecuperação do sujeito alcoólico, tais Alcóolicos Anônimos "AA","Croix d’or" e outras, consideram o alcoolismo como uma doença: "Oalcoolismo , segundo Croix d’Or, constitui progressivamente uma doença caraterizadapor uma fragilização do indivíduo antes de atingir uma fase verdadeiramentepatológica. Esta fase é precedida de um longo período de distorção que evoluilentamente para a inadaptação e depois pela regressão, para no fim chegar a umaestruturação anárquica no qual o fim é a demência ou obtusão intelectual e acatástrofe econômica." 2
      Em termos de comunicação talvez um dos melhores trabalhos sobre oalcoolismo que encontramos no Brasil é a biografia de Garrincha escrita por um dosgrandes jornalistas brasileiros, Ruy Castro "Estrela solitária"3
      Na orelha do livro lemos
" Estrela solitária é umahistória de amor, um romance de ação, um documentário social, um drama sobre oalcoolismo, um livro para ser lido com a mesma emoção com que foi escrito."O alcoolismo de Garrincha tem suas origem na própria cultura da cachaça. Desde cedo elefoi tratado com o cachimbo: " mistura de cachaça com mel de abelhas e canelaem pau, posta para curtir numa garrafa envolta de cortiça e pendurada numa viga do teto.O pai certificava antes se a cachaça era da boa. O cachimbo não era usado para finsrecreativos ou embriagantes – pelo menos não de propósito - mas medicinais. Asmulheres o tomavam durante a gravidez. Depois do parto, continuavam tomando-o enquantodurasse o resguardo. Adultos e crianças o tomavam como purgante, xarope fortificante epara combater gripes, lombrigas, coqueluche, asma e dor de dentes. Aos bebês era dadoaté como tranqüilizante; uma ou duas colheres antes de dormir para não terem sonhosagitados. Graciliano Ramos admite em Infância ter sido embriagado muitas vezes dessaforma"(Pg.21). Amaro o pai de Garrincha foi criado a cachimboe o próprio foi criado do mesmo jeito. Assim começou o drama da Estrela Solitária.
      O alcoolismo é uma realidade complexa e dramática. O alcoolismo évicio, doença , dependência, sofrimento?. Michel Legrand quando fala do álcool ocompara com " o Diabo e o Bom Deus"
, lembrando o existencialismo deJean-Paul Sartre: "O álcool é conhecido, fabricado e consumido desde temposimemoriais; é espalhado em todos os recantos do planeta no horizonte da humanidade. Comoentender, que na sua substância , tem alguma coisa de pouco comum. Alguma coisa deextraordinário, com que sem dúvida pode rivalizar nenhuma droga. O que é? Sua infinitaagilidade, sua prodigiosa variedade e heterogeneidade de expressões de paladares, deefeitos. Pode ser celebrado como um favor dos deuses ou ser odiado como um malefício,obra de Satanás. Pode se consumir pouco, nada, muito, apaixonadamente, até a loucura.Para uns exalte à alegria para outros mergulho na tristeza; para uns torna carinhoso eafetuoso, para outros exacerba a violência, Para uns exalta , para outros deprime Parauns levanta até o céu para outros torna o homem bicho. Talvez ainda opera tudo isso. Deum momento para outro num turbilhões desenfreado, muda, modifica os seus efeitos:exaltação, euforia, depressão, tristeza, raiva, medo, remorso vergonha. Porque e comose abster? Mas também como não ter medo quando o consumo desencadeia num mal-estarautodestruidor do funcionamento alcoólico?"4 Talvez por tudo isso quemnão passou pelo drama e o sofrimento do alcoolismo entenderá esta problemática.
      Nota-se na explanação conceitual e reflexiva do Prof. Dr. VIGNERON:
      A necessidade iminente da comunicação comoviabilizadora de um processo construtivo da conscientização dos sujeitos alcoólicos.
      Segundo a OMS há de se considerar como mais propenso ao uso das drogaso adolescente:
      Sem adequadas informações sobre o efeito das drogas;com saúde deficiente; insatisfeito com sua qualidade de vida; com personalidadedeficientemente integrada; com fácil acesso às drogas (Projeto Conhecer).
      A esse trabalho interessa o primeiro item, ou seja, saber maisà propósito das informações sobre drogas – álcool – veiculadas nos:suplementos dirigidos especificamente aos jovens.
      A ANDI (Agência de Notícias dos Direitos da Infância) concluiatravés dos resultados das pesquisas sobre "Os Jovens e a Mídia"(veiculados em seu site – www.bireme.br/bvs/adolec/p/cadernos)que o comportamento das revistas e suplementos dirigidos especificamente ao público jovemvêm apresentando mudanças significativas:

  • as publicações estão abandonando os estereótipos editoriais – assuntosconsiderados "áridos" eram riscados da pauta.
  • as transformações contribuem para a inclusão de temas importantes como prevenção aoHIV; gravidez precoce; qualidade da educação; violência; medidas sócio- educativasaplicadas ao jovem em conflito com a lei; políticas públicas para a juventude e projetoscomunitários
  • tem dado ênfase aos direitos dessa faixa da população

      Para essa avaliação fora elaborado um índice de Relevância Social,correspondendo a um indicador do compromisso dos veículos para jovens com aformação/informação e segundo suas pesquisas esse indicador tem crescidosubstancialmente. Quando foi medido pela primeira vez (1997) esse índice era de 24,2% e amais recente pesquisa (1999) já registra um índice de 36,1%.
      São temas considerados de Relevância Social (para o período denovembro de 1998 a abril de 1999): AIDS & DST; Cultura; Direitos & Justiça;Drogas; Educação; Família; Formação Profissional; Gravidez; Kosovo ; Meio Ambiente;Mídia; Portadores de Deficiência; Projetos Sociais; Protagonismo Juvenil; Saúde;Sexualidade e Violência.
      Apesar da crescente cobertura das temáticas socialmentesignificativas, existe uma dificuldade encontrada, pelos editores dos veículos, emcontemplar de forma mais homogênea todas as retrancas citadas.
      Existe uma certa lentidão em integrar definitivamenteà pauta questões como Formação Profissional, Saúde, Sexualidade, AIDS & DST eViolência. Predominam os temas de entretenimento e mesmo que cheguem a abordar assuntosque contribuam para a formação de seu público, retrancas cruciais como Gravidez ePortadores de Deficiência estão longe de merecer a devida atenção.
      O agrupamento que nos interessa: Família; Drogas, Projetos Sociais,Gravidez, Meio Ambiente e Portadores de Deficiência vem sendoignorados em termos deinserções, tem recebido no máximo a faixa de 50 inserções no período de seis meses.Apesar dessa constatação verifica-se uma tendência de crescimento das temáticasrelacionadas a saúde do adolescente, sem contudo afirmarmos que se tenha chegado próximoao patamar ideal, como já fora mencionado.
      A ANDI aponta para a necessidade dos profissionais de jornalismoatingir:
      A compreensão quanto ao papel estratégico querepresentam no processo de conscientização dos jovens, integrando o conceito de que aoprofissional da mídia jovem cabe também o papel de educador.
      Na dissertação de mestrado de GOBBI (doutoranda da UMESP), Natrilha juvenil da mídia impressa - Identificação, perfil e análise dos suplementospara jovens veiculados nos jornais diários do Brasil, encontramos um inventário daquantidade de suplementos para jovens, veiculados nos jornais brasileiros, distinguindo asdiferenças entre as publicações dos diversos estados, caracterizando o perfil dossuplementos.

      Na análise da autora:

      Nos jornais das cinco regiões e dos três prestigiepapers, analisados num período de um mês, o tema Drogas tem uma inserção deapenas 6% e o de Saúde 0%.
      O tempo de estudo foi o mês de abril de 1999 e foram analisados oitoperiódicos, com duas edições de cada um, perfazendo um total de 16 edições. Essesdados nos parece significativos da falta de homogeneidade das inserções desses temas.
      Por outro lado, verificamos a presença do tema alcoolismo ou altoconsumo de bebida alcoólica em revistas como a VEJA e no suplemento folhateen, daFolha de São Paulo (várias reportagens). São matérias com linguagem acessível, comdepoimentos de especialistas, consumidores adultos e jovens, alcoólatras, familiares dealcoólatras e adidos em recuperação.
      Como a informação a respeito dos malefícios da bebida alcoólicachega ao universo teen?
      A revista VEJA em reportagem de 28 de maio de 1997 "Acrua realidade" abordou a questão do alcoolismo em adultos e jovens. Menciona umencontro de adidos:
       Vindas do Brasil inteiro , elas chegavam de ônibusfretado de carro, bicicleta, táxi ou, quem morava nas redondezas, a pé mesmo. Passaram oferiado enfurnadas em auditórios e salas, ouvindo palestras ou dando depoimentos. Mesmosem se conhecer, reconheciam-se no essencial: à exceção de alguns conferencistas, todoseram alcoólatras. E sobreviventes. Festejavam os cinqüenta anos de fundação dosAlcoólicos Anônimos, AA. No Brasil. Naquela platéia , qualquer um que se levantasseteria uma história de perdas e precipício semelhante para contar.
      O Psiquiatra, MARCOS MICELLI, que atua no Hospital Psiquiátrico doPinel – Rio De Janeiro – explica na matéria:
      "Não creio que exista algum trabalhocientífico de importância , em algum lugar do mundo, que mostre que o alcoólatra podevoltar a beber com moderação. Não importa a quantidade ou a freqüência com que apessoa beba, , ela não consegue diminuir o seu patamar ou mantê-lo diminuído por longotempo".
      Ainda na mesma matéria utiliza-se o recurso de pesquisas de organismosde prestígio com OMS, apontando as possíveis conseqüências do uso abusivo do álcool ea caracterização da doença do alcoolismo:
       Micelli, como cerca de 85% dos médicos americanos considera oalcoolismo uma doença, no sentido de ser um distúrbio involuntário. A OrganizaçãoMundial de Saúde classifica a doença do alcoolismo como síndrome, de causas múltiplas.A metabolização do álcool passa por uma substância chamadaaldeído acético (amesma encontrada na combustão de motores a álcool ) e se transforma em glicose por umprocesso de transformação celular. Isso explica porque muitos alcoólatras que tomamcachaça e não comem nada ainda têm energia para continuar bebendo todos os dias.
       Esclarece também quanto a responsabilidade social da mídia e aimportância da imagem do consumo de bebida alcoólica para a promoção da "culturado porre" na nossa sociedade:
      A pesquisadora Ilana Pinsky, do Instituo de psicologiadas USP e co-autora, com o professor Ronaldo Laranjeira, do livro O Alcoolismo,:analisou2107 comerciais de TV para a sua tese sobre propaganda e bebidas alcoólicas natelevisão brasileira e constatou que há mais comerciais de bebidasalcoólicas na TV do que de não alcoólicas.

      Enfatizando a argumentação exposta na introdução deste trabalho osautores do livro lembram que:
      "hoje, a sociedade não faz outra coisa senãoconvidá-lo a beber . E, quando você faz parte dos 10% que se tornarão alcoólatras, elasimplesmente o rejeita".
       Quanto ao consumo entre os jovens aponta para aprecocidade acentuada progressivamente da aquisição desse hábito entre os jovensbrasileiros. Segundo o psiquiatra gaúcho PAULO KNAPP (autor do livro Prevenção daRecaída):
      "Hoje, a garotada começa a beber entreos 12 e os 13 anos de idade, ao passo, que cinco ou dez anos atrás a iniciação se davaentre 14 e 15 anos, em média."
      A revista VEJA de 14de maio de 2000 retoma ao temado alcoolismo focado no adolescente de colégios particulares "Recreio com cerveja- Adolescentes estão bebendo cada vez mais cedo em bares vizinhos de colégiosparticulares da cidade de São Paulo".
      
A matéria tem como ponto forte os depoimentos deadolescentes que consomem álcool de maneira inconseqüente e que revelam um traço comum,o da desinformação.
       "De segunda a quinta - feira- a gente só vaiquando falta algum professor, mas na sexta é de lei , a turma sempre se reúne nobar", diz Ana, 15 anos, aluna do 1º colegial de uma escola no Butantã.
      
Já com relação ao consumo próximo aos colégios a sensação deimpotência fica clara:
       Muitos jovens costumam ser transgressores e,no geral, os colégios pouco podem fazer depois que eles cruzam o portão de saída. O quechoca é a facilidade cada vez maior com que meninos e meninas compram e consomem bebidasem lugares públicos.
      Especialistas apontam para a necessidade do esclarecimento e da nãoconivência com atos inconseqüentes dos jovens:
      A proibição está longe de ser um simples moralismo ou uma meraconvenção. Já que, ingerido em grande escala antes dos 18 anos, o álcool acarretagraves conseqüência físicas e psicológicas. "Na adolescência, o sistema nervosoainda está em formação" explica MARIA LÚCIA FORMIGONI, coordenadora daUnidade de Dependência de Drogas da Universidade Federal de São Paulo. "Por isso, a possibilidade de ficar dependente é muito maior".
      A matéria da VEJA, chega a chocar com observações realistas comoestas:
       Veja, São Paulo, percorreu bares próximos aescolas. Constatou-se a surpreendente naturalidade com que estudantes entre 14 e 17 anos,que muitas vezes tomam achocolatado no café da manhã, às vezes se embriagam depois dasaulas.
      Seguem-se depoimentos de adolescentes:
       "Bebo umas três garrafas cada vez que sentoaqui". Márcio, 15 anos, aluno do 2º colegial Ele contou que sua mãe sabe que o baré seu destino após as aulas. "Ela só pede para que eu não exagere." Neide,aluna do 1º colegial:
       "Meus pais sabem, mas não gostam, mas também nãoproíbem. Comecei a beber com 11 anos. Aos 12, tomei o primeiro porre. O álcool deixavocê mais sossegada, alegre. Toda Sexta a gente vem aqui. Acho que bebo três vezes porsemana. Sei me controlar . Não vou me tornar uma alcoólatra". Laura, 15 anos,aluna do 1º colegial:
      A matéria também dá espaço para especialistas que apontampara a necessidade da interferência dos pais para educar e informar devidamente seusfilhos:
       "Educar dá trabalho diz o psiquiatra epsicoterapeuta de jovens Içami Tiba. Antes de questionar os filhos, eles pensam na mão-de- obra que vai dar e acabam deixando para lá".
      
Segundo um levantamento feito em 1997 pela Unifesp, o álcool é adroga mais consumida pelos jovens. De 2730 alunos de escolas públicas da capital ouvidos,74% o experimentaram pelo menos uma vez. As taxas de reprovação coincidem com aintensidade do uso. Quem bebe mais leva mais bomba na escola. Ao contrário do que seimagina, o álcool , e não a maconha, é a principal porta de entrada parra as drogasmais pesadas.
      Aponta também para o meio propício para a busca de transgressões porpartedos jovens:
       O histórico familiar influi muito. "Paisseparados, brigas e agressões são alguns dos motivos que levam o jovem ao álcool"-afirma a psicóloga Denise de Michelli.
      No âmbito educacional, ou seja, a veiculação de informações arespeito do crescente alcoolismo juvenil , segundo a professora IZABEL GALVÃO éprecária e recente. "Há uma década em geral as escolas achavam que por queacontecia fora de seus muros era apenas problema dos pais. Hoje isso tende a mudar".
      Tenderá a mudar, pois essa política de isolamento, de não assumirpara si a responsabilidade social, não pode fazer parte das instituições que lidam comeducação, até porque o reflexo do crescimento do alcoolismo juvenil expande-se dedentro para fora e de fora para dentro. Não há muros que possam isolar a escola, o lar eo espaço público.
       "O importante , para os pais e para as escolas,é reconhecer que ele existe e , a partir, daí, mostrar para o adolescente que a pessoasó pode tomar a decisão de beber quando tiver condições de assumir todos os riscos eresponsabilidades que essa decisão traz. E isso nunca acontece antes dos 18 anos"(Içami Tiba).
      Um dado que os analistas da ANDI também verificaram é que ocomportamento dos veículos dirigidos aos jovens apresentam oscilações nas retrancassocialmente relevantes como Drogas e pode acontecer devido a dependerem de "ganchosfactuais", aqueles capazes de forçar as portas da mídia, são as notícias quentes.No caso das drogas um exemplo foi o lançamento do livro da jovem PALOMA KLISYS: "Qualé o barato", um relato de sua experiência no mundo das drogas. Esse fatomereceu várias inserções na mídia jovem.
      Entramos em contato com KLISYS, que é estudante de jornalismo, pedindopara que ela opinasse a respeito do crescente consumo de álcool entre os jovens. KLISYSescreveu um artigo a respeito deste assunto especialmente para este trabalho:
      "Vivemos em uma sociedade de consumo que gira emtorno de basicamente três valores: poder, status e dinheiro. As drogas são um artifíciode união entre estes valores... Há um incentivo cultural ao consumo de drogas, sendoelas lícitas ou não. Isso indica uma relação de consumo com as coisas... A drogaatinge todas as camadas sendo um elemento de massificação apesar de atingir com maiorimpacto as classes subalternas; até porque elas têm menos chances de se livrarem dadependência por uma questão econômica. O jovem marginalizado não tem expectativa mas ojovem de classe média enfrenta o mesmo problema, cercado em um condomínio sem apossibilidade de conhecer outras realidades, está enclausurado.
      O álcool além de ser socialmente aceito, funciona comoum objeto intermediário entre o adolescente, seu grupo, e o universo adulto. Seu usoacaba representando um modo de satisfazer a necessidade de auto-afirmação, deaceitação, acolhimento e de inclusão em determinado contexto.
      
Exemplificando-se alguns aspectos abordados por Paloma emsua explanação há o caso do filho mais velho do primeiro ministro britânico , TonyBlair. Eron de 16 anos foi preso por estar bêbado. A sua prisão causou um grandeembaraço a Blair, pois recentemente ele reconheceu que os incidentes de violênciacausados pelos jovens bêbados converteram-se num problema nacional. Propôs a imposiçãode multas a quem for encontrado em estado excessivo de embriaguez (Fonte: Estado de SãoPaulo-7/7/2000).
      Portanto torna-se:
       Perigoso, quanto se trata de informar, associar o uso dolcool em excesso somente às classes menos favorecidas, o que gera preconceito emascaramento social. É sem dúvida um problema social que não escolhe sexo, cor, nemclasse social e que tende à massificação via cultura do consumismo desenfreado.
      Porém se o objetivo é atingir o público jovem na suatotalidade, a comunicação se torna absolutamente necessária. Há de analisar-se amídia que está mais perto deste publico alvo e portanto, tentar refleti-lo em seudiscurso e nas temáticas tratadas nestas publicações de modo a informá-lo econscientizá-lo . Como exemplo do uso pertinente da mídia podemos citar o jornal Folhade São Paulo de 3 de maio de 1999 no 6° caderno, folhateen.
      O artigo em "Onde acaba esta festa?" de SILVIA RUIZ discute:
       A atitude descompromissada por parte dos pais queliberam a bebida alcoólica, assim como a provação por parte da sociedade, do bar quevende e da propaganda que incentiva.
      Tendo como resultado imediato desta atitude complacente eirresponsável o número crescente de adolescentes envolvidos com a bebida que por vezestorna-se a porta de entrada para outras drogas como a maconha, cocaína e crack.
       Nota-se que houve uma preocupação por parte da autoraem não ser explicitamente didática e nem assumir uma postura crítica, fazendo uso deuma linguagem simples, direta e de um formato que seduza o leitor.
      Sendo a folhateen um espaço dirigido aos adolescentesprocurou-se em abordar o assunto por meio de depoimentos com faixa etária condizente ados leitores e histórias de vida muito parecidas.
      F.L.Q, 16 anos " Eu experimentei bebida pela primeira vez emcasa. Meu pai bebia e me dava a espuminha da cerveja. Você toma a espuma, depois dá umgole, depois bebe um copo..."
      L.L.A, 15 anos "As propagandas influenciam o subconsciente.Você não percebe, mas o impulso positivo para beber fica gravado na sua cabeça".
      No mesmo artigo há abordagem de como a publicidade da bebidaalcoólica é veiculada livremente nos meios de comunicação:
      Os jovens estão na mira dos fabricantes de cerveja.A maior parte das campanhas publicitárias elegeu como seu target- público-alvo.
      A cerveja Antártica investe pesado em campanhas publicitárias. Indode anúncios em revistas voltadas para esse público até a Internet.

      CONSIDERAÇÕES FINAIS

      Por meio dos dados expostos nesse trabalho nota-se que já há umacerta mobilidade por parte da mídia em debater temas tabus. A folhateen da Folhade São Paulo abriu espaço para discutir o alcoolismo juvenil, assim como, a revista Vejapor duas vezes abordou esta temática.
      Analisando-se estes dados conclui-se que a mídia omite-se sobreassuntos polêmicos, apesar de haver um sopro preconizante de que tal situação no futurotenderá a modificar-se. Quanto a eficácia da comunicação representada pela VEJA e a folhateen observa-se o seguinte:
      - A revista VEJA não é uma publicação estritamente ligada aouniverso teen;
      - Uma das reportagens sobre alcoolismo juvenil restringiu-se a VejaSão Paulo, ou seja, analisou-se um problema de uma forma local, apesar dos depoimentosdos especialistas. Esta mesma reportagem concentrou-se no universo da classe média dealunos de escolas particulares;
      - Ressalta-se, porém a iniciativa e o conteúdo recheado pordepoimentos - histórias de vida- que de uma certa forma une o depoente ao leitor.
      - A folhateen fez uma abordagem do tema com profundidade, massem um tom didático e crítico;
      - A folhateen também apoiou-se em depoimentos a fim de atingiros seus leitores, aproveitando para falar sobre os sites das cervejarias na Internet e deprogramas como o extinto H (da emissora Bandeirantes) tão apreciados pelosjovens. Apesar da crítica implícita aos sites e ao programa que na época aceitava opatrocínio de uma cervejaria, tudo é tratado de maneira o menos didática possível.
      Faz-se necessário ressaltar que é pouco o que tem sido feito atéagora. Pois o consumo de álcool não é apenas uma questão de saúde Há a questão daviolência, do dirigir embriagado . Segundo DIMENSEIN somos órfãos: apesar dos fatose números a respeito dos malefícios da droga lícita, são raras as campanhas advertindopara os perigos do álcool. As campanhas sobre o álcool nem pífias são. Inexistem.Pior: a indústria da bebida é ainda mais agressiva do que a indústria do fumo. Quantomais penso, mais me convenço de que a educação para a cidadania é a prioridade: nãoé só uma questão de justiça ou moral. (Folha de São Paulo, 20/5/2000)
      Um traço comum encontrado em todas as matérias é o uso dedepoimentos de consumidores de bebida alcoólica. Outros elementos encontrados nosdiscursos é a fala do especialista, o discurso competente que visa esclarecer àpropósito dos males que o consumo abusivo de álcool pode provocar; referência apesquisas de instituições competentes, com dados numéricos que apontam para ocrescimento do consumo entre os jovens, juntamente com o crescimento das conseqüênciastrágicas que esse hábito pode acarretar (desde os múltiplos efeitos do alcoolismo atéincidência de tragédias como homicídios, atropelamentos e acidentes automobilísticos);um recurso menos freqüente nos discursos é o de fazer uso de depoimentos de familiaresde alcoólicos.
      Todas as matérias dos suplementos teens pecam por não sepreocuparem devidamente com o seu papel de educador. A mídia jovem, aquela que elaboraseus discursos pensando o receptor adolescente vem vencendo resistências, rompendo comtabus, no entanto os temas de relevância para os adolescente ainda não atingem umnúmero de inserções favoráveis; além disso é preciso saber conciliar linguagem"sedutora" (o formato das matérias dos suplementos teens) e ainformação consistente e reflexiva (matérias da VEJA).

      Referências bibliográficas

1 DE HOLLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque– Novo dicionário da língua portuguesa.

2 CROIX d’OR – Op. cit. p. 84

3 CASTRO, Ruy – Estrela solitária, um brasileirochamado GARRINCHA. São Paulo. Companhias das letras, 1995. 520 p.

4 LEGRAND, Michel –Le sujet alcoolique, essai depsychologie dramatique. Paris. Desclée de Brouwer. 1997. P. 17.

      BIBLIOGRAFIA

      Bibliografia referente ao alcoolismo, adolescência e suplementos juvenis:

DIMENSTEIN- Autópsia da Insensatez- Folha de São Paulo- 20 dejunho de 19991

FOUREZ, Gérard – A Construção das Ciências. São Paulo.Editora Unesp. 1995

GOBBI, Maria Cristina – Na trilha juvenil da mídia impressa– Identificação, perfil e análise dos suplementos para jovens veiculados nosjornais diários do Brasil. São Bernardo do Campo: Dissertação (Mestrado emComunicação Social) – Universidade Metodista de São Paulo,1999.]

IZIDORO, Alencar "Alcoolismo é maior entre os homens" –Artigo do Caderno Cotidiano da Folha de São Paulo, de 12 de maio de 2000.

SCHIMIDT, Cristina Silva - Viva São Benedito! Ed. Santuário-2000- SP

SILVIA, Ruiz – "Onde acaba esta festa?" – Artigo doCaderno folhateen da Folha de São Paulo, de 3 de maio de 1999.

VIGNERON, Jacques – Projeto de pesquisa: O papel dacomunicação na prevenção do alcoolismo juvenil e na recuperação dos sujeitosalcóolicos para jovens no contexto das organizações 1997

      Sites

ANDI – Agência de Notícias dos direitos da Infância, Crianças e adolescentes na mídia(www.andi.org.br)

DIMESNTEIN - O país bêbado - (www.aprendiz.com.br)

FORMENTI, LIGIA (Site sobre ALCOOLISMO) – (www.alcoolismo.com.br)

LOBATO, ELIANE & PROPATO, VALÉRIA - ISTO É - (www.terra.com.br/isto/e)
 (www.inca.org.br)

PROJETO CONHECER (Colégio Bahiense Gávea) -
www.bahiense.g12.br/gavea/procon.htm

      Bibliografia referente a metodologia:

ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith & GEWANDSZNA, Fernando – OMétodo nas Ciências Naturais e Sociais – Pesquisa Quantitativa e Qualitativa .São Paulo. Pioneira. 1998

EPSTEIN, Isaac. Apostila de aula. Análise de conteúdo. SãoPaulo, Umesp, 2000

VIGNERON, Jacques – Projeto de pesquisa: O papel da comunicação na prevenção do alcoolismo juvenil e na recuperação dos sujeitos alcóolicos para jovens no contexto das organizações. 1997.

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*Aparecida Ribeiro dos Santos é graduada em Letras e mestranda em Comunicação Social na UMESP.
*Babette de Almeida Prado Mendoza é graduada em Ciências Sociais e mestranda em Comunicação Social na UMESP.

 
 
 
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