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Jornalismo Científico: no interior da "torre de marfim"

Endil Tamara*

      RESUMO
            Ciência de um lado, sociedade de outro? Será que esta oposição caminha para o crescimento substancial da humanidade? é de se pensar na evolução da medicina, genética, astronomia, ciência humanas, se não estivessem voltadas ao desenvolvimento de pessoas contextualizadas no tempo, espaço e relacionamento social. Partindo deste princípio, através do jornalismo científico encontramos possibilidades concretas para estender o conhecimento científico à sociedade.
      No início e no desenrolar da história (trabalho monográfico), visualizamos as diferenças, por vezes, antagônicas entre os produtores de ciência e da comunicação. Embora seja real, até consistente o conflito na relação cientista-jornalista, procuramos desmistificar ciência e jornalismo científico, bem como entender a recepção de ambos no que se refere às mensagens produzidas pelos meios de comunicação na área científica.
      A "torre de marfim" abre as portas. Extrapola situações peculiares quando linguagem rebuscada e simples contatam para popularizar a ciência.

      Palavras-chave: Ciência Jornalismo Científico Comunicação

      INTRODUÇÃO

            Concentração e silêncio misturam-se na rotina do cientista. Ele incorpora a introspecção para produzir ciência, assim como participa de congressos e interage com a comunidade acadêmica, no entanto, os homens vestidos de branco – estereótipo criado pelo senso comum - precisam abrir as janelas e desvendar a ciência diante do público através dos meios de comunicação. Nesse instante surge a presença do jornalista, que toca a fechadura e força a entrada no interior da "torre de marfim".
      
No primeiro semestre deste ano, observávamos a relação entre ciência e sociedade com olhos curiosos. é instigante saber o que se passa entre quatro paredes quando jornalista e cientista estão frente a frente. Primeiro, porque o profissional da comunicação, muitas vezes, não domina a linguagem usada na ciência, o que traz um certo receio para fonte de informação, o cientista. Já de antemão, percebíamos tal incompatibilidade na relação entre ambos os profissionais. Na verdade, ela foi criando corpo e tornado-se mais visível a cada encontro que tínhamos com médicos e/ou pesquisadores para produção de matéria jornalística aos leitores do Caderno de Saúde do Jornal O Nacional, onde trabalhamos. Ao tratar um assunto técnico, sempre a mesma história: "você pode enviar-me a matéria para eu ler antes da publicação?".
      Nesse sentido, já nos identificamos com a afirmação do médico e jornalista da Folha de S. Paulo Júlio ABRAMCZYK na publicação do I Encontro Paranaense de Jornalismo Científico (1989), que no primeiro capítulo destacou bem a disparidade entre os profissionais. Para ele, o atrito é real, uma vez que o cientista não quer corrigir a matéria escrita pelo jornalista, mas sim, verificar se as palavras estão realmente refletindo aquilo que disse. Nesse caso, o jornalista incomoda-se em ter o aval do cientista para publicação do material. Ao longo do desenvolvimento, perceberemos bem a existência deste conflito.
      Entretanto, a incompatibilidade entre cientista-jornalista não foi a maior preocupação que sentíamos neste trabalho monográfico, tendo em vista, que o problema de pesquisa é como estabelecer um elo de ligação entre ciência e sociedade levando-se em conta os limites do jornalista ao adentrar o mundo científico, dada a diferença de linguagem entre as duas áreas do conhecimento.
      Desta forma temos como objetivo geral:
      Conhecer o conceito de jornalismo científico, responsável pela transmissão da mensagem vislumbrada a partir da relação jornalistas e cientistas, considerando também a recepção, ou seja, de que forma eles mesmos recebem a mensagem dos meios de comunicação.
E como objetivos específicos:

a) Analisar as limitações de jornalistas e cientistas, sendo que de um lado o jornalista é mediador, ponte entre a ciência e a sociedade, de outro, tem dificuldade para aproximar-se da "torre de marfim".
b)verificar as diferentes formas de linguagens utilizadas por ambas as partes.
c) detectar, através da teoria da recepção, como jornalistas e cientistas recebem mensagens que tratam de ciência.

      Para ultrapassar os "trancos e barrancos" que incomodam jornalistas e cientistas, nos propomos a entrar no interior da "torre de marfim" e assim conhecer os mecanismos e conceitos de uma área que pretende adentrar a torre, relacionar-se com pesquisadores e levar a ciência ao conhecimento público.
      Ao buscar definições encontramos autores que julgamos essenciais no processo de abertura da torre. No primeiro capítulo do presente trabalho, compreendemos Jornalismo Científico a luz do pesquisador espanhol Manuel Calvo HERNANDO (1989. p. 15), que afirma "o jornalismo cumpre uma das suas mais nobres finalidades: a de estender uma ponte entre o conhecimento e a sociedade, promovendo a mais difícil e exigente democracia que é a da cultura".
      Neste aspecto, o jornalista e professor Wilson da Costa BUENO (1989), destaca que jornalismo científico é um segmento do Jornalismo, tem características jornalísticas e está presente nos meios de comunicação de massa.
      Além do subsídio destes pensadores e jornalistas científicos, que atuam como divulgadores da ciência, também contatamos via e-mail com o autor já citado acima, que escreveu a primeira tese de doutoramento na área. Dentre as várias conversas que tivemos com Wilson BUENO, em duas (anexo 1, anexo 2) nos respondeu à algumas indagações pertinentes ao trabalho. Em relação à revisão bibliográfica, ainda utilizamos o conceito do cientista Newton Freire MAIA para saber o que é ciência. Nesse sentido, define ciência como um conjunto de práticas que visam conhecimento elaborado através de uma metodologia específica.
      Como forma de perceber a visão de jornalistas e cientistas em torno do jornalismo científico e ciência, buscamos no segundo capítulo, de acordo com Jesús Martín BARBERO, Guillermo Orozco GÓMEZ (ano) o conhecimento da teoria da recepção. Julgamos necessário compreender o significado teórico deste recente estudo, para observar jornalistas e cientistas como receptores ativos que atuam diante da mensagem produzida pelos meios de comunicação. Esta investigação começou a ser analisada em meados dos anos 80, tendo a proposta de romper com o sistema de comunicação tradicional, que vê o receptor como mero agente passivo.
      Após conceituar teoria da recepção, que conforme BARBERO (ano) existe diversas e múltiplas fontes de mediação interagindo frente aos meios de comunicação, nos valemos de entrevistas semi-estruturadas com dois jornalistas e dois cientistas de Passo Fundo.

      1 - EM DIREÇÃO À "TORRE DE MARFIM"

            Enxergar além da extensão permitida pelo olhar é lançar todos os sentidos na busca do conhecimento interno e externo. Tentar entender assim, comportamentos, relações, conceitos e processos para vislumbrar significados verdadeiros da realidade. Descobrir elos de ligação - invisíveis - entre pessoas e objetos pode nos aproximar dos mitos endeusados que constróem a imaginação humana. Neste longo trajeto percebemos a capacidade de decifrar códigos, que mesmo "cabeças" do senso comum podem desvendar. Mas as pessoas simples, não letradas, abstraem pensamentos complexos, de difícil compreensão, ou esta tarefa está incumbida apenas para mentes brilhantes? Aqui chegamos aos limites que separam senso comum e ciência. No entanto, há um mediador que facilita para um lado e complica-se por outro: o jornalista.
      Ele caminha em direção a ponte, quando começa atravessá-la esbarra nas idiossincrasias da ciência representada pelo cientista. No meio do percurso um pára diante do outro, pois é desafiador se aproximar de realidades e linguagens distintas. Embora haja certo receio, o jornalista precisa completar o caminho e chegar no outro lado da ponte, certo que cumpriu com o papel de tornar público o complicado mundo da ciência.
      Em relação a este fato, Júlio ABRAMCZYK (1989) jornalista da Folha de São Paulo, presidente da Associação Ibero-americana de Jornalismo Científico e médico, destaca que para chegar a um laboratório e ao entendimento com algum cientista, há um longo caminho, porque jornalistas e cientistas falam línguas completamente diferentes.
      "Isto é realmente um foco de atritos porque, quando um cientista acaba uma entrevista, geralmente diz: ‘Não se esqueça de trazer para eu corrigir’. Na verdade, ele não quer corrigir, ele tem medo de que a coisa não tenha sido bem explicada e não entende que não precisa ‘explicar bem explicadinho’, porque o que estamos passando é a informação". (ABRAMCZYK, 1989, p. 16)
      Para o jornalista sair do senso comum e adentrar a ciência ou ainda, a "torre de marfim", onde alguns cientistas se escondem, é um complicado processo inserido no papel do jornalismo científico.
      Mas antes de vislumbrar conceitos diversos sobre esta área, é preciso abrir as portas – fechadas até com cadeado - e desmistificar o conhecimento detido dentro das quatro paredes desta torre.
      Ao se referir a tal questão, ABRAMCZYK no I Encontro Paranaense de Jornalismo Científico (1989), considera que o Poder relaciona-se com a mistificação do Saber. "Acredito que isto está relacionado com o fato de os cientistas, durante um certo tempo, terem estado instalados numa "torre de marfim". Então, só eles sabiam. Só eles queriam saber para poderem deter o poder. " (ABRAMCZYK, 1989, p. 26).
      Neste caso, utilizamos do senso comum, a expressão "torre de marfim" que revela apropriação do conhecimento sem intenção ou espaço para ampliá-lo ou estendê-lo a outros segmentos da sociedade.

      Abrem-se as portas da torre

      O jornalismo científico vem romper os limites da torre e extrapolar a produção de cientistas para o público, tentando assim, popularizar a ciência. Seus conteúdos, pesquisas e descobertas, através da relação entre jornalistas e cientistas, encontram direção para atravessar a ponte. Na realidade, a evolução se consolida junto ao público nos meios de comunicação de massa (imprensa, rádio e televisão).
      As portas da "torre de marfim" abrem-se no momento que a ciência estende seu serviço à sociedade, de forma a beneficiá-la com resultados das diversas pesquisas e estudos formulados. Além disso, as pessoas devem acompanhar o desenvolvimento científico e tecnológico, que aliás, utiliza subsídios públicos para ser trabalhado.
      Na concepção do jornalista e professor de jornalismo científico da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, Wilson da Costa BUENO (1989) – que realizou em 1985 a primeira tese de doutoramento na área da divulgação científica – "jornalismo científico é um segmento do Jornalismo, tem características jornalísticas e está presente nos meios de comunicação de massa." (BUENO, 1989, p. 6). Outro ponto fundamental, levantado por ele, é que este trabalho normalmente tem a intermediação de um jornalista, tendo produção, edição deste profissional.
      Enquanto há controvérsias conceituais que relacionam jornalismo com divulgação científica, BUENO destaca que é diferente a produção jornalística quando comparada à palestra que o cientista realiza para audiência acadêmica. Há peculiaridades em torno da informação sobre Ciência e Tecnologia disseminada no ambiente onde profissionais da área reúnem-se para participar de conferências, e aquela elaborada através do jornalismo científico. Este último possui toda uma estrutura de produção, a qual permite escrever, elaborar, gravar, editar; textos, falas e imagens.
      No trabalho Ciência e Imprensa – A fusão a frio em jornais brasileiros, Roberto Pereira MEDEIROS, em sua tese de mestrado na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo em 1996, utiliza autores como Wilson BUENO, M. Calvo, HERNANDO para definir jornalismo e jornalismo científico. No capítulo 1.5, BUENO faz uma transposição das características: atualidade, universalidade, periodicidade e difusão. Segundo ele, a característica de atualidade é preenchida pelos "fatos (eventos, descobertas) ou pessoas (cientistas, tecnólogos, pesquisadores) que estejam diretamente ou indiretamente relacionados com o momento presente". Nesse sentido, o "jornalismo científico preenche a característica da universalidade; a periodicidade se dá pela manutenção do ritmo das publicações ou matérias, certamente antes em conformidade com o desenvolvimento peculiar da ciência do que com o próprio ritmo de edição dos veículos jornalísticos, a característica de difusão é preenchida pela circulação do material pela coletividade ao qual se destina." (BUENO, 1985, p. 21-22).
      Para legitimar o discurso do Jornalismo, buscamos o conceito de Clóvis ROSSI que diz, em seu livro O que é Jornalismo (10ª ed. 1994): "Jornalismo é uma fascinante batalha pela conquista das mentes e corações de seus alvos: leitores, telespectadores ou ouvintes... Essa batalha pelas mentes e corações, entretanto, é temperada por um mito – o mito da objetividade... Afinal, entre o fato e a versão que dele publica qualquer veículo de comunicação há a mediação do jornalista..." (ROSSI, 1994, p. 9).
      Na busca em ganhar "mentes e corações", o jornalista científico, segundo ABRAMCZYK é apenas um intermediário (ponte) entre cientistas e a sociedade. Desta forma, o profissional está na área do Jornalismo que se dedica à decodificação da linguagem complicada, hermética, da ciência para o leitor.
      "É a função do jornalista, ao decodificar esta linguagem científica, torná-la acessível ao público em geral. É um pequeno grande mundo, que se dirige às pessoas dos 8 aos 80 anos de idade, desde os possuidores do mais raso conhecimento cultural ao mais raro dos espíritos cultos." (ABRAMCZYK, 1989, pg. 15)
      Ao definir jornalismo científico, percebe-se a importância da relação entre o jornalista e cientista, para assim, consolidar a popularização da ciência. Sem a versão utilizada pelo cientista ZIMAN, J. M., que acredita ser impossível traduzir e abordar assuntos científicos com uma linguagem acessível e de fácil compreensão para o público em geral. Ao contrário, ZIMAN, J. M., disse que o cientista não deve se "esquivar" diante da "publicidade, sensacionalismo e exuberância multicolorida" que os profissionais dos veículos de comunicação de massa fazem.
      De maneira até radical, demonstrando certo preconceito, ele relaciona jornalismo com publicidade e sensacionalismo, que, segundo o Dicionário Aurélio (p.500) "é divulgação e exploração de matéria capaz de emocionar ou escandalizar. "
      Depois do papel do jornalista salientado por ABRAMCZYK, este tipo de pensamento quebra a transmissão da mensagem científica para as pessoas de conhecimento mais simples, chamadas leigas, ou seja, que não conhecem os métodos, pesquisas, enfim a ciência. Contudo, sua popularização acaba sendo prejudicada quando cientistas fecham as portas da "torre de marfim".
      O pesquisador espanhol Manuel Calvo HERNANDO compreende que o Jornalismo cumpre uma das suas mais nobres finalidades: "a de estender uma ponte entre o conhecimento e a sociedade, promovendo a mais difícil e exigente democracia que é a da cultura." (HERNANDO, 1989, p. 15).
      Outro conceito ressaltado por ABRAMCZYK é que o jornalismo científico é uma área especializada que se ocupa, na imprensa, rádio e televisão, com os fatos relacionados à Ciência e Tecnologia e assim, deve ser exercido por um jornalista profissional.
      Neste contexto, há diversas formas de difundir a difícil linguagem científica nos meios de comunicação. ABRAMCZYK define que informação científica pode ser apenas uma simples notícia sobre o mais recente avanço de um setor da ciência, ou uma notícia sobre algum problema, em que são feitas análises. Quando divulgada a ciência torna-se pública.
      Já de acordo com José REIS, decano da Divulgação Científica no Brasil, primeiro presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico, há dois tipos fundamentais para popularização da Ciência: artigos e reportagens. "Nos artigos, o interesse se prende à transmissão dos fatos e princípios da ciência, atuais e clássicos. A reportagem, porém, procura penetrar a ciência atual, à medida que a elaboram os Centros de Pesquisa." Aliás, José Marques de MELO (Universidade Metodista de São Paulo, O Artigo Científico, p. 236) constata que o artigo é o meio de expressão dos cientistas.
      "... o artigo ocupa lugar hegemônico. Trata-se de uma forma de expressão legitimada pela comunidade acadêmica mundial, constituindo unidade de referência para aferir a produtividade individual e o reconhecimento coletivo dos produtores de C&T." (MELO. Ano. p.236)
      Além de trazer a preferência da comunidade científica pelo artigo, o professor ainda distingue que artigo científico é diferente do jornalístico. O primeiro, direcionado para ciência, obedece uma estrutura rígida com linguagem fechada, voltada para o público intelectual da área. Já o segundo, caracteriza-se pelo estilo argumentativo, tendo uma linguagem mais solta. Também através deste formato, os cientistas buscam omitir opinião sobre assuntos diversificados, sendo publicados em jornais e revistas de informação geral.

      A Ciência desmistificada

      Compreender o emaranhado de conceitos, regras e métodos da ciência permite ver, entender suas disparidades, construção, defeitos e perfeição. Observar cada tijolo sendo posto um sobre o outro, cada janela que abre para sua expansão. A "torre de marfim" se abriu para o mundo. Hoje é urgente acompanhar o desenvolvimento constante das diferentes Ciências. Desde as humanas às biológicas há progresso, regresso, deformações para aprimorar, criação de novos conceitos, regras e métodos. Os "meros mortais" caminham do senso comum à ciência escancarada pela comunicação, viva no Jornalismo Científico.
      O significado de ciência traçado pelo cientista Newton Freire MAIA define-a como "um conjunto de descrições, interpretações, teorias, leis, modelos, etc, visando ao conhecimento de uma parcela da realidade, em contínua ampliação e renovação, que resulta da aplicação deliberada de uma metodologia especial (metodologia científica)." (MAIA, 1992, p.24).
      Mas antes de chegar a este conceito, o autor visualiza dois aspectos diferentes da ciência: a já feita (como disciplina) e a do processo (que está sendo feita). No primeiro aspecto revela a ciência cotidiana, ensinada por professores nas escolas, universidades. Esta de certa forma, é vista como dogma, (fé), inquestionável. Ao ponto que a outra, feita e elaborada pelo cientista, está sempre modificando-se.
      Contrariamente ao conceito de MAIA, o escritor Bertrand RUSSEL diz que a ciência não passa de "senso comum educado". (O panorama científico, p. 71). Entretanto, o cientista contesta afirmando que o senso comum julga-se dono das verdades eternas. Portanto, não tem o requinte da ciência, pois guarda seu dogmatismo negando-se a aceitar as teorias científicas que contradigam sua "religião". (MAIA, 1992, p. 23).
      Outro autor que tem uma visão bastante crítica e que também se opõe ao conceito de MAIA é Rubem ALVES; para ele a ciência é "uma especialização, um refinamento de potenciais comuns a todos". (ALVES, ANO, p. 12).
      Um pouco mais longe e ousado ALVES define que a ciência é a metamorfose do senso comum. Além disso:
      "A ciência não é um órgão novo de conhecimento. A ciência é a hipertrofia de capacidades que todos têm. Isto pode ser bom, mas pode ser muito perigoso. Quanto maior a visão em profundidade, menor a visão em extensão. A tendência da especialização é conhecer cada vez mais de cada vez menos". (ALVES, ANO, p.12)
      Embora Alves defenda radicalmente seu ponto de vista, ele traz um conceito interessante sobre o que é senso comum. Destaca que esta expressão foi criada por pessoas que se julgam acima do senso comum, como uma forma de se diferenciarem das pessoas que, segundo seu critério, são intelectualmente inferiores.
      Dentro de sua abordagem, podemos novamente, nos remeter ao público que se interessa por matérias científicas, mas faz parte do senso comum. Não tem conhecimento e quando lê um artigo científico dificilmente entende a linguagem expressa pelo cientista. Aí vem o mediador (que faz a ponte), o jornalista. Ao mesmo tempo que ele sai do senso comum e tenta entrar na "torre de marfim" para decifrar os últimos experimentos sobre a vacina para Aids, por exemplo, ele precisa entender o vocabulário do pesquisador, afinal, depois irá transmitir para audiência.
      No entanto, toda esta história foi para dizer que a especialização deve ser vista como meio mais fácil para compreender a ciência. Agora sem deixar os neurônios atrofiar, cegando a visão de enxergar adiante porque entende Jornalismo Científico. Afinal, relações, comportamentos humanos, fazem parte de Ciências chamadas Sociologia, Filosofia, História. E sem dúvida, elas sempre interessam aqueles que estão do outro lado da ponte: o público.

      2 - O HOMEM COMO RECEPTOR AINDA É UM HOMEM

      Penetrar e entender um mundo heterogêneo, formado por diversas pessoas com bagagens culturais diferentes, concepções e relações distintas é algo complexo e contraditório. Talvez porque a própria essência humana seja ambígua, diversificada. Neste prisma, mergulhamos nas profundezas díspares para integrar membros desiguais, aproximar identidades incomuns. (é maiúsculo) à beira do mar descompassado, em meio à maresia, encontramos clareza acerca de pensadores que investigaram nas entrelinhas da Teoria da Recepção. Navegaram na viagem nebulosa Jesús Martín BARBERO, Guillermo Orozco GÓMEZ e outros tantos que preocuparam-se com os estudos da audiência, ou seja, espectadores imersos no sistema ondulado dos meios de comunicação.
      Há um tempo atrás, década de 60 na América Latina, comunicólogos consideravam o receptor um indivíduo meramente passivo diante das mensagens dos meios. Dizia-se que no processo de comunicação o emissor transmitia informações com objetivo de persuadir o receptor. Segundo Aurélio, persuasão é levar a crer ou a aceitar, induzir, convencer. Desta forma, os autores Pedro Gilberto GOMES e Denise Maria COGO afirmam que "por mais que se esforcem, os grupos que procuram trabalhar com esta nova visão de recepção deixam intacta uma compreensão de comunicação que possui a sua origem em Aristóteles, para quem a retórica se compunha de três elementos – locutor, discurso e ouvinte – cujo objetivo era a persuasão do ouvinte. Portanto, permanecem dentro de um esquema e aceitam um modelo que, por sua própria estruturação, é vertical e autoritário, abrigando no seu bojo a passividade receptiva". (GOMES e COGO, 1998, p. 18).
      Através dos anos, os investigadores da comunicação foram encontrando métodos para romper e ultrapassar paradigmas atrasados, que viam a recepção simplesmente alienada. O pesquisador Luis Ramiro BELTRÁN sugeriu um "Adeus a Aristóteles", dizendo que neste modelo o receptor das mensagens é passivo e está submetido, "uma vez que quase nunca se lhe dá a oportunidade adequada para atuar também, como verdadeiro e livre emissor." (GOMES e COGO, 1998, p. 20). Para ele, a construção de um novo conceito de recepção é urgente, pois devemos estabelecer um modelo de comunicação humanizado, democrático e não elitista.
      Em contrapartida, depois do fôlego de BELTRÁN (acento), outros "navegadores" foram a fundo para ultrapassar o sistema comunicacional retrógrado. Contudo, a pressão das ondas despertava ação do receptor, ao contrário do que se pensava, ele não se movimenta conforme o embalo das águas. Embora esteja submetido, é um ser vivo que reage, rema contra ou favor – dependendo do caso – ao impulso forte do mar. Além de viver ativamente, traz na bagagem bóia, salva-vidas que simbolizam sua história relacionada com outras pessoas, seu conhecimento aprendido na comunidade onde habita. Por isso ele é um ser vivo social.
      "Cada pessoa é uma unidade referencial, com espaço, preconceitos e preconcebidos próprios. O processo comunicacional não é outra coisa que a interação de dois ou mais espaços pessoais. Para que haja essa interação, é necessário que alguém faça uma proposta de entrada no espaço do outro que, dependendo de seu interesse no momento, permite ou não tal entrada." (GOMES e COGO, 1998, p. 21).
      Neste ponto de vista, percebe-se que os indivíduos não são isolados uma vez que ocupam lugares sociais. Eles estão nestes lugares porque expressam-se através da linguagem. Os autores GOMES e COGO (1998), destacam que a linguagem é um tipo especial de atividade, integrando-se no complexo fenômeno da cultura. Diante da palavra cultura, entendem que se trata de um conjunto de atividades realizadas pelo homem como membro de uma comunidade, conceito que consideramos neste texto.
      Falar, manifestar gestos são instrumentos que envolvem significados e sentidos, assim, de maneira implícita ou explicitamente, emissor e receptor transmitem mensagens. Quando a recepção liberta-se do sistema vertical de comunicação passa a decodificar diversas significações.

      Mediações

      Depois de quebrar o padrão comunicacional, um novo elo se estende na ligação entre emissor, meio, mensagem, receptor. Na realidade não havia relação direta ao longo desta extensão, embora visualmente pareciam sincronizar-se um com outro, pois Jesús Martín BARBERO (?) salienta a impossibilidade de traçar relacionamento onde não existe mediação. A questão ainda permeia múltiplas e diferentes formas mediáticas no contato entre emissor e receptor. Antes de fazer tal afirmação, BARBERO privilegia a cultura como a grande mediadora de todo processo de produção comunicativa.
      Mediante o conceito elaborado pelo pesquisador, a "cultura é a maior mediação dos processos sociais, sendo também demonstrada nas práticas concretas entendidas como ação social dos sujeitos sociais." (BARBERO, ano, p.115).
      Para compreender sua teorização e visualizá-la realmente, ele distingue três tipos de mediações: socialidade que são as práticas cotidianas; ritualidade relacionada à rotinas ou seja, repetição de práticas; e tecnicidade onde critica a postura assumida pelos meios e a tecnologia de comunicação. Este último tipo não deveria assumir um aspecto que modifique as percepções dos receptores, sendo, segundo o autor, meramente instrumental.
      De acordo com BARBERO, diversas fontes de mediação são pertinentes para conhecer a relação da audiência com os meios. Já se desmistificou aquele tradicional paradigma destacado por GOMES e COGO, portanto, se bem analisarmos percebemos que atuam várias mediações entre emissor e receptor. Isso acontece porque a recepção interage diante dos meios através da carga histórica construída com relações no mundo externo.
      Por conseguinte, o pesquisador define diferentes mediações. Em seu ponto de vista, a mediação individual provém da nossa individualidade como sujeitos cognoscentes e comunicativos. As mediações institucionais estão na família, escola, trabalho e igreja. Participamos de distintas instituições e ali também damos sentido na própria produção de significados. "Las mediaciones massmediáticas: en el caso de la TV podrían ser llamadas mediaciones videotecnológicas, y en el caso de la radio, radiotecnológicas. La propia tecnología ejerce una mediación." (BARBERO, ano, p. 117).
      Uma observação peculiar do autor refere-se ao estado de ânimo do receptor, que, segundo ele, é uma forma de mediação situacional. Diferente das mediações de referência que incluem todas aquelas características que situam o contexto, o ambiente determinado. Por exemplo, a idade, o gênero, a etnia, a raça ou classe social.
      Através dos cenários, transformados em palcos para os mais variados atores da vida real interagirem diante dos meios, a recepção atua com os processos de comunicação.
      "Si se entiende que el proceso de recepción no comienza cuando se está en contacto directo con el mensaje (leyendo, viendo o escuchando) sino que es parte de una práctica de leer, ver o escuchar, es posible entender que el proceso de la recepción pasa por diversos escenarios." (BARBERO, ANO, p. 118).
      Os cenários são lugares onde se produzem sentidos. BARBERO acredita que através dos cenários surjam novos significados. Nesses lugares as mensagens podem sofrer uma reinterpretação, reapropriação, ou ainda reelaboração, sendo que essas experiências refletem variabilidade ou não, mediante esse cenário.
      Outro ponto visto por BARBERO refere-se aos padrões de comportamento existentes nas mais variadas culturas. Através da simples forma como as pessoas se cumprimentam, por exemplo, pode-se perceber características peculiares de um determinado grupo social. "Cuando uno llega a un lugar y encuentra a otra persona, no siempre se saluda de la misma manera: algunos dan un beso, otros dan dos, las variaciones son sobre el mismo tema". (BARBERO, ANO, p. 121).
      Da mesma forma que salientamos os padrões comportamentais dos indivíduos, também temos âmbitos cognoscitivos. Para explicar melhor, o pesquisador destaca quatro campos ocupados e movidos diariamente pelos receptores. O primeiro, saber que, significa toda informação acerca dos objetos; o segundo, saber como, é entender como atuar em certa ocasião; o terceiro, crer em algo, que contrapõe os dois âmbitos anteriores porque basta crer, não precisa saber que e nem como; já o quarto volta-se ao emocional. Este último campo analisa o estado afetivo e emotivo do ser humano, bem como contradiz o saber que, saber como e crer em algo, pois estão relacionados ao aspecto racional. Diante destas definições, o autor elucida influências quanto ao estado racional e, principalmente, emocional, onde os meios de comunicação exercem ação sobre os receptores. Nesse caso, muitas vezes, somos submetidos a cenas que atraem âmbitos envolvendo a emoção.
      Sob a ótica de BARBERO, os estudos quantitativos investigados no passado não consideravam uma dimensão político-social maior, ao contrário, apresentavam certa ingenuidade política e econômica. Entretanto, ele verifica uma tensão quanto à investigação qualitativa, pois não é fácil vincular pessoas tão heterogêneas com algum meio de comunicação. Ainda mais, que no final da década de 80, descobrem um receptor ativo e não passivo como se pensava na concepção tradicional. Assim, este receptor é capaz de redimensionar mensagens dos meios e buscar outra maneira de contatar com seus conteúdos.
      Neste contexto, Guillermo Orozco GÓMEZ (acento) afirma que além de se ter atribuído à audiência uma alta capacidade de redimensionar aquilo que é oferecido pelos meios de comunicação, percebe-se um alto grau de criatividade na produção de significados e sentidos dos receptores. Contudo, a audiência apresenta um conjunto de agentes ativos, cuja interação com os meios não está determinada, e sim condicionada e, sobretudo, mediada de diversas maneiras. "Se podría decir que los procesos de recepción involucran cierto margen de acción creativa, pero siempre dentro de condiciones que no son de nuestra propia creación." (GÓMEZ, ANO, p.186).
      Conforme a compreensão do autor, o processo de recepção não é linear, inequívoco ou transparente, e muito menos se reduz durante o contato direto com os meios e mensagens. Ele considera que:
      "Es un proceso que se extiende en el tiempo mezclándose con la vida cotidiana. Es un proceso muy complejo en el que intervienen múltiples condicionamientos situacionales, culturales, estructurales, racionales y emotivos." (GOMÉZ, ANO, p. 188).
      A interpretação de GOMÉZ nos remete, novamente, para explicações teóricas de Jesús Martín BARBERO, enquanto somos sujeitos sociais, consolidamos, através das relações culturais e históricas, posturas e atitudes diante dos meios de comunicação.
      Ao mesmo tempo que BARBERO e o próprio GOMÉZ (acento) consideram que as mediações provém da cultura, construção de indivíduos sociais e assim por diante, este último afirma que as mediações surgem a partir de distintas fontes. Na realidade, as fontes significam que enquanto receptores e sujeitos cognoscentes, membros de uma cultura, entendemos e atuamos frente ao espelho refletido por ela. Sem esquecer que, mesmo atuando com criatividade, ainda somos condicionados aos meios.
      No processo de recepção, o pesquisador destaca a influência dos "supertemas", ou seja, temas prioritários envolvidos com educação, trabalho, política, economia, sexualidade entre outros. "Los supertemas sirven como referentes o como filtro de aquellos mensajes que nos son relevantes. Por ejemplo, cuando vemos un noticiero en la TV, aquellas noticias que se conectan con alguno de estos supertemas, son a las que prestamos mayor atención." (GOMÉZ, ANO, p. 192).
      Embora os "supertemas" possibilitem que os receptores selecionem assuntos dos meios de comunicação com os quais tenham afinidade e interesse, as mediações permitem conhecer as influências específicas que intervém nos processos de recepção. Essa abordagem da teoria da recepção, segundo GOMÉZ, (acento), ainda é objeto de investigação múltipla, dinâmica e requer um desenho metodológico afinado e rigoroso para compreender a audiência dos meios e sua relação completa e contraditória.
      Na "torre de marfim" – expressão advinda do senso comum que revela apropriação do conhecimento - as idéias estão prestes a descobrir novos experimentos. Vez que outra, as paredes rochosas iluminam-se com relâmpagos, flashes que apontam o conhecimento. Silêncio para pesquisar, aprimorar aquele esboço que logo, logo sairá dos limites do papel e ganhará amplitude das ruas, casas, escritórios. A porta aos poucos está sendo destrancada. Correntes, cadeados são movidos. Ouvem-se vozes zunindo, passos movimentando-se, alguns caminham em direção à porta, a fechadura é tocada e, finalmente, aberta para todos os olhos, ouvidos, sentidos, enfim, conhecerem o interior da "torre de marfim".
      A ciência efervesceu em meio os quatro cantos da torre depois de ter sido pensada, formulada na cabeça dos cientistas. Específica, rigorosa metodologicamente, torna-se pública, chega nos bairros, periferias e centro da cidade, atingindo aqueles que se interessam em conhecer os novos medicamentos, a elaboração e testes da vacina contra AIDS (sigla do nome, em inglês, da síndrome da imunodeficiência adquirida - SIDA retirado do livro A Ciência Por Dentro) entre tantos exemplos. Se realmente descoberta, a tão almejada conquista soaria forte nas caixas de som, apareceria nas telas coloridas, ganharia páginas e páginas de papel jornal para levar ao público – receptor – o grande lance do mundo científico. Afinal, cálculos, teorias, fórmulas não sairiam da "torre de marfim" e, logo, não seriam conhecidos pela sociedade se não houvesse um mediador que entendesse sua complexidade e traduzisse-a para o grande público.
      Os verbos levar, explicar, tornar acessível, clarear, são terminações perseguidas pelo Jornalismo Científico. A ferramenta desta atividade circunda cabeças, lares, corpos, ruas díspares que procuram informação através de rádios, televisões, jornais, revistas, entre outros meios.
      No primeiro capítulo do presente trabalho procuramos definir o que é Ciência, o que é Jornalismo e a junção de ambos, o Jornalismo Científico, para conhecermos diferentes e similares papéis interpretados por jornalistas e cientistas, assim como detectarmos ruído, conflito na comunicação dos dois profissionais. O primeiro, geralmente, é generalista, cobre desde futebol a assuntos da área científica para um determinado veículo, já o outro, enclausura-se no "interior da torre de marfim" e não sai para falar à população o que está produzindo, o que está pesquisando. Aí se dá o impasse entre jornalistas e cientistas.
      Antes que possamos seguir adiante, relembramos que ciência não é algo "de outro mundo", inatingível ao senso comum, ou seja, às pessoas que não têm conhecimento científico. Na concepção de Rubem ALVES, "senso comum é aquilo que não é ciência, e inclui todas as ‘receitas’ para o dia-a-dia, bem como os ideais e esperanças que constituem a capa do livro de ‘receitas’." (ALVES, 1992, p.14). Ainda nesta linha de pensamento ele considera que senso comum e ciência são expressões da mesma necessidade básica, a necessidade de compreender o mundo, a fim de viver melhor e sobreviver.
      Em contrapartida, o conceito de ciência descrito pelo cientista Newton Freire MAIA diz que:
      "Ciência é um conjunto de descrições, interpretações, teorias, leis, modelos, etc., visando ao conhecimento de uma parcela da realidade, em contínua ampliação e renovação, que resulta da aplicação deliberada de uma metodologia especial (metodologia científica)." (MAIA, 1992, p. 24).
      Portanto, fazer ciência depende de um rigor metodológico para avaliar e comparar idéias, obtendo novos conhecimentos. Diferente da atividade jornalística, que não trabalha com tanta exatidão, pois tem um vasto leque para incluir coberturas, matérias de geral, esportes, cultura, economia, política, ciência. Neste caso, esbarramos na relação conflituosa entre jornalistas e cientistas. O impasse começa por aí, quando ambas as partes referem-se à divulgação, tendo em vista que, de um lado, o cientista percebe o despreparo do jornalista para produzir a matéria e já transmite as informações de forma limitada, e de outro, o jornalista considera os termos técnicos dispensáveis uma vez que seu público, dificilmente, se interessaria pelo linguajar acadêmico.
      Esta clara visão manifestada na relação entre os dois profissionais é lembrada por Wilson BUENO, do qual utilizamos conceitos no primeiro capítulo deste trabalho, sendo que na presente análise contatamos via e-mail. Conforme sua concepção e experiência na área, embora a situação tenha melhorado bastante nos últimos anos, o preconceito dos cientistas em relação aos jornalistas que cobrem a área é acentuado. "Pesquisa realizada junto a mais de 100 pesquisadores sobre a divulgação científica no Brasil, na USP, sob minha coordenação, mostrou que os cientistas creditam sobretudo aos jornalistas a má qualidade da divulgação científica. Acham os profissionais despreparados, incompetentes e também não poupam críticas aos veículos de comunicação, mais interessados, segundo eles, em cativar a audiência."
      Realmente há conflito, e a cientista que entrevistamos para esta pesquisa, Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes, também afirma que o jornalista, para conquistar seu público, atribui uma visão geral do fato, preocupando-se em deixar o conteúdo atraente. Isso pode, na sua opinião, comprometer a divulgação científica, pois significa mudança de foco e até sensacionalismo para o cientista.
      Novamente citamos o ponto de vista do professor Wilson BUENO, "ainda que os cientistas possam ter razão no que diz respeito à qualidade da divulgação científica nos meios de comunicação de massa, eles exageram um pouco quando creditam o problema apenas aos jornalistas." Na verdade ele considera que "os cientistas, em sua maioria, são também responsáveis por este processo de divulgação deficiente, na medida em que têm pouco contribuído para a sua melhoria; pelo contrário, com arrogância e falta de sensibilidade para importância da democratização do conhecimento, não atuam como parceiros dos jornalistas. Quase sempre, não colocam a divulgação da ciência como prioridade, agindo de maneira elitista."
      "Evidentemente, estas incompreensões de ambas as partes só impedem que a situação se modifique. As duas categorias, jornalistas e cientistas, devem ter consciência de que depende, em grande parte, do seu esforço e trabalho conjunto, o sucesso do processo da democratização do conhecimento, fundamental para a construção da cidadania".
      Diante desta realidade, nos parece que o jornalismo científico cumpre o papel de compreender a linguagem hermética utilizada pelo cientista, e transmitir o papel social da ciência à população. Em relação a tal questão, ABRAMCZYK afirma que a característica principal do jornalismo científico – que tem a função de traduzir a linguagem complexa da ciência para o público e assim, democratizá-la, popularizá-la à sociedade - é a de proporcionar a democratização do conhecimento. Desta forma, a população toma conhecimento dos projetos de pesquisa, seus resultados e importância.
      A democratização da ciência proposta por ABRAMCZYK é consolidada quando jornalistas e cientistas estiverem cientes da responsabilidade do jornalismo e da ciência. Dentro desta perspectiva, entrevistamos dois jornalistas e dois cientistas para quem perguntamos: o que é popularizar a ciência?
      A jornalista Fátima Trombini, que atua profissionalmente há 18 anos, e hoje é chefe da redação do Jornal O Nacional e assessora de imprensa da Câmara Municipal de Vereadores de Passo Fundo, acredita que popularizar a ciência significa fazer com que seus benefícios e avanços cheguem a toda a população. Em sua opinião, justamente por isso que eles – os cientistas – "falam bonito" pois, no máximo, conseguem atingir a elite, que é minoria. O restante das pessoas ainda está tomando aspirina." (fonte oral).
      Já na percepção do cientista Erlei Melo Reis, professor e pesquisador do curso de Agronomia na graduação e mestrado da Universidade de Passo Fundo:
      "se houvesse no país um aumento no número de cientistas você estaria popularizando, assim, um maior número de pessoas se engajariam na ciência. Outro aspecto da popularização é o povo estar a par, acompanhar tudo aquilo que foi gerado e produzido pela ciência. Tem dois aspectos; popularizar no sentido de aumentar o número de pesquisadores, bem como divulgar à sociedade." (fonte oral).
      Ainda nesta questão, a jornalista Adriane Bertoglio Rodrigues, que trabalha em sua empresa Agues Comunicação, na qual presta assessoria e é também produtora do Uirapuru Ecologia, programa de rádio que aborda assuntos relacionados ao meio ambiente em Passo Fundo, considera que a ciência já é popular, tendo em vista que todos os dias nos jornais há algum espaço destinado a temas científicos, descobertas, ou alguém estudando e pesquisando.
      "Sempre têm resultados sendo divulgados, porém, falta um acompanhamento, você saber início, meio e fim da pesquisa e não apenas divulgar o resultado da mesma. Neste sentido, a ciência seria bem melhor divulgada se não houvesse cortes." (fonte oral).
      Para Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes, bacharel em História Natural em 1962, licenciada em História Natural em 1963 e doutora em Ciências (Genética) pela UFRGS em 1971, pesquisadora do Centro Nacional de Pesquisa de Trigo, Embrapa significa:
      "levar para a sociedade as informações que estão num grupo restrito de especialistas. No caso da genética, por exemplo, o avanço é tão grande que mesmo profissionais ligados à área como médicos, agrônomos não estão acompanhando tudo o que se descobriu e o que vem se descobrindo sobre genética. Isso é muito importante porque faz parte de nós mesmos, de como nós somos e de como nós podemos ser. " (fonte oral).
       O ponto de vista dos entrevistados em relação à popularização da ciência volta-se especialmente para a importância do jornalismo científico, ainda mais tratando-se da interação de jornalistas – mediadores – com cientistas – fonte de informação. Entretanto, essa integração não acontece de forma simples e harmônica quando os dois profissionais falam línguas diferentes. Contudo é preciso encontrar o meio termo, ou seja, uma linguagem que não distorça aquilo que o cientista disse, e que ao mesmo tempo, seja acessível ao grande público. Segundo Sérgio PRENAFETA, professor de Biologia, Química e Jornalismo, com especialização em divulgação científica:
      "O jornalista científico deve descomplicar a ciência com o propósito de democratizá-la. Para ter êxito nessa tarefa, ele deve, pelo menos, entender do que está falando. Não se pretende que seja um especialista em ciência, mas antes um especialista em cientistas." (PRENAFETA, 1989. p. 25).
      Entender a ciência e saber informações prévias acerca de um determinado tema, antes de conversar com cientista é primordial para o jornalista atravessar a porta da "torre de marfim", contextualizar, deixar claro as informações que precisa apurar e questionar a fonte, caso contrário, o cientista poderá direcionar a entrevista.
      Para seguirmos adiante, é importante fazermos uma nova apresentação dos entrevistados aqui presentes. Afinal, antes de serem jornalistas e cientistas, construíram sua própria história ao longo dos anos, baseada em relações com a família, a universidade, a religião, o ambiente de trabalho, os amigos, etc. Cada qual possui experiências individuais marcadas pela convivência social. Outro ponto essencial que decifra os significados reunidos nesta bagagem é a cultura. A compreensão expressada por Pedro Gilberto GOMES e Denise Maria COGO no livro O Adolescente e a televisão, considera cultura um conjunto de atividades realizadas pelo homem enquanto membro de uma comunidade.
      Levando-se em conta o estudo da teoria da recepção, abordado no segundo capítulo do atual trabalho, olhamos para nossos entrevistados como receptores ativos, que pensam, reagem e mediam sob múltiplas formas aquilo que recebem, visão compartilhada por autores como Jesús Martín BARBERO e Guillermo Orozco GOMÉZ. Sob este prisma BARBERO define cultura como sendo a maior mediação dos processos sociais demonstrada nas práticas concretas e entendidas como ação social dos sujeitos sociais.
      Após o conhecimento adquirido no capítulo que trazemos teoria da recepção, viramos a página para vislumbrar jornalistas e cientistas como indivíduos sociais, que dotados de aprendizagens distintas olham a ciência e a sociedade conforme a história e a cultura construída com passar dos anos. Mediante tal relação, descortinamos as janelas da "torre de marfim" para observar diferentes visões acerca do jornalismo científico. Assim, uma das principais dificuldades apontadas antes, refere-se à diferenciação entre linguagens faladas por jornalistas e cientistas.
      No entanto, a barreira da linguagem arma-se contra os que estão despreparados. Neste sentido, Fátima Trombini - vista aqui como receptora ativa - concorda que jornalistas e cientistas falam línguas diferentes. Ela diz que em função disso:
      "temos muitos problemas para fazer o material do dia-a-dia, uma vez que a gente precisa informar a população quando chega um medicamento novo, ou uma doença nova. Precisamos informar a comunidade, entretanto, eles vêm com nome científico, mas isso para a população não adianta, então temos que traduzir para o popular. Eu, por exemplo, entrevisto alguém desta área e já digo: vamos usar termos populares, queres usar linguajar científico usa, mas entre parênteses precisamos explicar o que significa". (fonte oral).
      Diante deste fato, Erlei Melo Reis – cientista que trabalha com metodologia científica e vê a ciência como verdade - enfatiza que já houve uma evolução por parte do jornalismo que está mais profissional. Logo no início de sua carreira científica, o pesquisador conta que em 1975 no Centro da Sala de Pesquisa de Trigo – Unidade da Embrapa, costumeiramente concediam entrevistas para jornalistas.
      "No entanto, depois eles distorciam completamente os fatos escritos comprometendo o pesquisador. Então, eu lembro que em função disso, passei a evitar jornalistas justamente por distorcerem fatos. Você sabe que nós, na ciência, temos que perseguir a verdade, somente a verdade. Muitas vezes declarava algo para um jornalista e ele procurava distorcer um pouco para dar sensacionalismo. Isso, dentro de uma instituição de pesquisa repercute mal, porque como o pesquisador foi declarar aquilo no jornal?" (fonte oral).
      Através da teoria da recepção, nos foi possível uma compreensão maior quando Erlei, Adriane, Fátima e Maria Irene demonstram suas crenças e cultura nas diferentes concepções expressadas sobre jornalismo científico. Na visão do cientista, o jornalista atribui significados que ele não considera os mais importantes na divulgação de matérias jornalísticas. Por isso, surgem o sensacionalismo e a distorção, bastante ressaltados pelo pesquisador.
      Em contrapartida aos profissionais que sensacionalizavam, Erlei destaca o exemplo do jornalista Ivaldino Tasca:
      "que tinha sempre a porta aberta na Embrapa, porque reproduzia fielmente todas as informações que passavam a ele, sem distorcer. Na pessoa dele nós confiávamos e até começamos a divulgar mais do que normalmente fazíamos. Eu penso que distorção é a prova do despreparo profissional da pessoa." (fonte oral).
      A jornalista Adriane Bertoglio Rodrigues salienta que, nesta questão, o jornalista tem que se adaptar a qualquer área que trabalhe, sendo que precisa conhecer os termos utilizados nas diversas áreas. Se o jornalista for trabalhar com a área médica, ou área ambiental, tem que saber os termos típicos de cada profissão: "eu acho que jornalista e cientista têm que encontrar um ponto de equilíbrio para expressar-se diante da população." (fonte oral).
      Embora a cientista Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes concorde que jornalistas e cientistas falem línguas diferentes, destaca que depende do momento do cientista, pois quando ele faz ciência utiliza uma linguagem e metodologia rigorosa e necessária na execução do experimento científico. Para ela:
      "Uma das dificuldades que existem em relação ao cientista e jornalista é a importância que cada atribui ao experimento científico. O cientista está realizando um experimento e aquilo é a coisa mais importante, visto que está envolvido naquele aspecto, enquanto os jornalistas, devem colocar aquilo dentro de um contexto mais geral e precisam apresentar ao público de uma maneira atraente. As vezes, ser atraente para o público pode significar mudança de foco, ou dar uma ênfase maior em aspectos que o cientista não acha os mais importantes." (fonte oral).  
      A respeito desta diferença, Wilson BUENO acredita que o sistema de produção jornalística e o sistema de produção científica são distintos e colidem sobretudo no que diz respeito ao tempo e aos objetivos. Pois, "o jornalista trabalha contra o relógio e privilegia a rapidez na divulgação da informação, visando atrair o seu público (leitores, telespectadores etc). Com isso, nem sempre a qualidade e a precisão da informação são atributos indispensáveis. Já o cientista não se sente, em princípio, pressionado pelo tempo (essa situação na verdade já mudou um pouco, porque a ciência patrocinada requer resultados pelo menos a médio prazo para as empresas que a financia) e dele se cobra consistência das informações. O conhecimento científico, diferentemente do fazer jornalístico, não tem o compromisso com o imediatismo. O jornalismo on line acirra ainda mais esta diferença entre a produção científica e a produção jornalística."
      Ainda na concepção de Maria Irene, a linguagem da ciência é uma linguagem específica.
      "O que define um resultado científico, um fato científico, é que sempre que tenha as mesmas condições você vai ter aquele resultado. Já para o jornalista ou a mídia, fica mais interessante apresentar a notícia de uma outra maneira, no entanto, há uma reação do cientista, quando os fatos não são colocados de forma correta, ou o significado dos fatos é interpretado de um modo que não leva em conta o conhecimento do cientista, ou ainda é distorcido para ficar mais vendável." (fonte oral).
       O que acontece, segundo BUENO, é que o cientista se incomoda com o fato de o jornalista exagerar certos aspectos, ressaltar pontos que, para o pesquisador, são secundários e mesmo utilizar metáforas para ilustrar suas matérias.
      Voltando a questão da linguagem e abordagem – disparidade primordial entre jornalismo e ciência – segundo Almyr GAJARDONI, o jornalista tem que passar informações sobre política, economia, esportes, tecnologia, ciência, para um público leigo em todos esses assuntos. "Tem que usar linguagem jornalística, não linguagem política, econômica, esportiva, tecnológica ou científica". (GAJARDONI, 1989, p. 25).
      Neste aspecto, abrimos um parêntese para conceituar linguagem jornalística. Em seu livro Linguagem Jornalística, o jornalista e professor Nilson LAJE afirma que a definição pretendida passa por três pontos: registros de linguagem; processo de comunicação e compromissos ideológicos. O primeiro abriga pelo menos dois tipos de linguagem: o formal, que conforme Lage, é próprio da modalidade escrita e das situações tensas e o coloquial, compreende as expressões correntes na modalidade falada, conversa familiar ou aquela usada entre amigos. Para entendermos melhor o que o autor explica, a linguagem formal é mais durável, pois tende a preservar usos lingüísticos do passado. Já a linguagem coloquial é espontânea, reflete a realidade comunitária, regional, imediata. 
      "Do ponto de vista da eficiência da comunicação, o registro coloquial seria sempre preferível. É mais acessível para as pessoas de pouca escolaridade, e mesmo para as que estudaram ou lidam constantemente com a linguagem formal, permite mais rápida fruição e maior expressividade." (LAJE, 1985, p.37). 
      Continuando o caminho para chegarmos à definição de linguagem jornalística, LAGE esclarece que no segundo âmbito a comunicação jornalística é referencial, isto é, fala de algo no mundo, exterior ao emissor, ao receptor e ao processo de comunicação em si. Deste modo, "o domínio da referencialidade permite diferenciar a linguagem jornalística da linguagem didática, ainda quando esta se propõe a divulgação do conhecimento ou divulgação científica." Exatamente é este o lugar onde queremos chegar, então o autor esclarece que nos textos didáticos, predomina a metalinguagem, ou seja, explicação ou definição de um item léxico por outro (... "a Organização das Nações Unidas compreende...", "as inflorescências se dividem em..."). Tal explicação contrapõe o campo do jornalismo: "aqui, as proposições principais dão conta de transformações, deslocamentos ou enunciações (a notícia); ou se formulam a partir de acontecimentos (a reportagem interpretativa, o artigo)." (LAGE, 1985, p. 39).
      No que tende a ser compromissos ideológicos, LAGE enfatiza que cultura é o espaço da identidade humana e que, nesse caso, a língua é a mais importante articulação da cultura. Assim, na linguagem jornalística torna-se possível mobilizar esforços, desde que não se afete a comunicabilidade, para motivar atitudes de resistência contra o monopólio em torno dos sistemas expressivos do idioma.
      Depois de fecharmos o parêntese que clareou a questão linguagem jornalística, voltamos à opinião dos entrevistados no diz respeito às linguagens diferentes de jornalistas e cientistas. A jornalista Fátima Trombini, vista aqui como receptora ativa, que avalia linguagem na postura de um profissional da comunicação:
      "eles querem divulgar seu trabalho, mas ao mesmo tempo, não querem abrir mão do seu palavreado. Se eles gostam ou não dos jornalistas problemas é deles, pois eles precisam de nós, assim como precisamos deles", (fonte oral).  
      Já o cientista Erlei Melo Reis, que tem outra postura profissional, ressalta que o jornalista deve se especializar na área da ciência. "Citando, por exemplo, o Tasca, ele era um jornalista científico que se especializou em Agricultura, então, depois começou entender o linguajar. Isso é muito importante." (fonte oral).
      A partir da linguagem, perguntamos ao cientista entrevistado: como estabelecer um elo entre ciência e sociedade levando-se em conta os limites do jornalista ao adentrar o mundo cientifico?
      De acordo com sua bagagem histórica responde:  
      "a sociedade precisa saber o que está sendo feito com seus impostos. Então a maneira de chegar a sociedade, quem vai traduzir para linguagem popular seriam vocês, jornalistas.. Entretanto, o cientista não vê necessidade, salvo se for um cientista político, que queira se promover politicamente. Agora, o jornalista na sua profissão, tem o dever de informar a comunidade. Eu garanto que a comunidade não sabe tudo, justamente, por esta distância. Nós pesquisadores não temos a mínima necessidade de dar uma notícia no jornal. Não vejo função nenhuma. No entanto, a comunidade pensa completamente diferente." (fonte oral). 
      Mediante a opinião expressa pelo pesquisador há diversas contraposições, visto que o cientista Newton Freire MAIA no livro A Ciência Por Dentro declara que:
      "O cientista tem uma séria obrigação em relação ao público. Deve, sempre que solicitado, divulgar suas pesquisas ou comentar as pesquisas de outros, em termos acessíveis, para que o grande público tome conhecimento delas e as entenda, mesmo sabendo que, de vez em quando, se-lhe-ão atribuídas sentenças que ele nunca disse. Desta forma, o jornal, o rádio, a televisão, etc. podem ser notáveis veículos de comunicação entre o cientista e o povo em geral." (MAIA, 1992, p. 190).
      Com uma bagagem cultural baseada nos estudos da História Natural, Genética, enfim, ciência, Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes percebe que o jornalista consegue ultrapassar a ponte – referência utilizada no primeiro capítulo – e levar conhecimento científico para sociedade, se ele informar-se mais:
      "o cientista precisa se abrir e o jornalista se informar. Eu também acho que o jornalista deve resistir a tentação de, digamos assim, moldar a notícia, porque é isso que faz o cientista se assustar." (fonte oral). 
      Há contradição, embora a necessidade do cientista sair da "torre de marfim" é fundamental para o jornalista fazer o elo de ligação entre ciência e sociedade. Mediante este ponto, a jornalista Adriane Bertoglio Rodrigues, em certo aspecto, pensa como pesquisador Erlei, pois destaca a especialização para o jornalista conseguir adentrar a ciência.
      "Se você quer se aprofundar numa área, então, deve buscar contato e relações, ter fontes e estar sempre aberta a estas fontes. Dizer, que mesmo em off, podem confiar no seu profissionalismo. Eu acho que mantendo boas fontes, você pode usar bem esta questão da ciência nos meios de comunicação." (fonte oral). 
      Fátima, também jornalista, concorda na questão da confiança entre os dois profissionais. No que se refere levar a matéria para o cientista ou médico ler antes de ser publicada, diz que não gosta de fazer seu trabalho e depender de um aval do entrevistado. Para ela, se o profissional lhe concedeu a entrevista deve confiar nela, além disso:
      "se levar para ler tenho que fazer a matéria duas semanas antes, tendo em vista que se levar cinco vezes, as cinco vezes têm que corrigir. Claro que tenho humildade de afirmar que quem domina o assunto é ele, mas é ruim levar o material para corrigir." (fonte oral).
      No Guia Prático para "Camelôs" e "Bailarinas" – Debate sobre jornalismo cientifico, o editor chefe dos jornais Informática Hoje, Jornal de Telecomunicações e Jornal de Software, Wilson MOHERDAUL destaca que no jornalismo científico, de toda forma, não parece grave que uma vez que outra se concorde em mostrar o texto à fonte antes da publicação. "Acho até que, ao trabalharmos determinados assuntos, pode ser recomendável fazer isso. Eu mesmo me lembro de pelo menos uma vez ter lido por telefone um texto sobre um prêmio Nobel de Física a um físico da Universidade de São Paulo que eu havia entrevistado". (MOHERDAUL, 1989, p. 28).
      O médico e jornalista da Folha de S. Paulo, ABRAMCZYK alega que a citação textual das palavras do cientista, entre aspas, é de sua responsabilidade e não do jornalista. No entanto, "desde que ele não interfira no estilo jornalístico, por que não deixá-lo tranqüilo e conquistar uma fonte permanente de informações?". (ABRAMCZYK, 1989, p. 28).
      Como abordamos no segundo capítulo a teoria da recepção, voltamos aplicá-la para dizer que tanto jornalistas e cientistas são indivíduos sociais que mantém contato com os meios de comunicação, instituições científicas, familiares, religiosas. Partindo daí, cada um recebe e reage, de uma determinada forma, aquilo que é produzido pela mídia (imprensa, rádio e televisão). Deste modo, estas pessoas (entrevistados) também atuam como mediadores, expressando múltiplas maneiras de analisar o produto elaborado pelos meios de comunicação. Sem dúvida, eles interpretam e criticam conforme a relação social, cultural e histórica que têm com o mundo afora.
      De acordo com Jesús Martín BARBERO, mediação é o lugar onde se dá sentido para o processo de comunicação. O pensador privilegia a cultura como a grande mediadora de todo processo de produção comunicativa. Para ele:
      "Lo que es importante entender en el tema de la mediación para cualquier investigación cualitativa, es que hay relaciones directas entre los componentes de un proceso de investigación. En el caso de la comunicación, entre lo tradicional: emisor, medio, mensaje, receptor no hay una relación directa, sino que toda relación es mediada." (BARBERO, ano, p. 114).
      Quando se pensa em mediação, segundo BARBERO, deve-se lembrar que receptores percebem matérias científicas de maneira diferenciada, tendo em vista que possuem trajetórias e relações também diferentes.
      Desta forma, a receptora Fátima Trombini, 45 anos, - formada em Jornalismo desde 1982 na Unisinos em São Leopoldo - acredita que ciência e religião andam juntas. Primeiro porque a religião é um suporte para pessoa.
      "Se formos observar a experiência de cada indivíduo, o cristianismo predomina entre outras religiões, sendo que a bíblia é o livro mais antigo e ao mesmo tempo, se mantém atual. No entanto, tem alguns padres que não acompanham sua evolução e se colocam contra a ciência, que avança e é necessária à humanidade. O mundo começa a despencar é doenças de um lado, problemas de outro, então, a ciência precisa avançar para dar suporte à vida.
      Embora pareça diferente, a religião e a ciência podem andar juntas. Tivemos muitos avanços, agora não podemos parar, pois as doenças, os problemas da humanidade devem se agravar com passar tempo." (fonte oral).
      Com formação em Agronomia no ano de 1964 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, mestrado na Universidade de São Paulo – USP e doutorado na área de Fitopatologia, Erlei Melo Reis, 58 anos, além de ser cientista, pertence à Igreja Adventista 7º Dia e declara-se um criacionista.
      "Acho que precisamos de mais fé para aceitarmos as teorias da evolução propostas por Charles Darwin e eu não vejo hoje, uma incompatibilidade entre ciência e religião. Pelo contrário, sinto-me muito feliz na ciência e na religião também. Eu trato uma coisa diferente da outra e sendo um criacionista, existe hoje mais provas da criação, portanto, o cientista procura cada vez mais isto na natureza do que confirmar os elos perdidos na cadeia da evolução de Charles Darwin. Então, não vejo incompatibilidade e não creio que o homem vai conseguir sintetizar a vida, por exemplo, do nada fazer um ser vivo ou pelo menos reproduzir as formas primitivas de vida como é proposta na teoria da evolução." (fonte oral).
      A jornalista Adriane Bertoglio Rodrigues, 32 anos, que cursou Jornalismo na Unisinos em São Leopoldo de 1987 até 1999 - traz vivências religiosas marcantes, direcionadas para esoterismo entre outras linhas. Para ela, religião e ciência não andam juntas (o que difere da concepção de Fátima).
      "Acho que é uma coisa bem diferente da outra. Até porque religião você tem vários crédulos. Nesse campo se esconde muita coisa que a própria ciência já revelou. Por sua vez, a ciência está avançando cada vez mais. Eu acho até assustador, quando agente chega no nível de ter coelho transgênico. Nesse sentido, muitas vezes, acho que o próprio homem está sendo cobaia para muitos experimentos. Somos cobaias de tudo na verdade. Isto independente de religião. Somos também cobaias da religião." (fonte oral).
      A cientista Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes, 60 anos - bacharel em História Natural, licenciada em História Natural pela UFRGS e doutora em Ciências (Genética) com o tema: Citogenética e Evolução de Gramíneas Nativas do Rio Grande do Sul - percebe a relação entre ciência e religião como sendo fé e ciência.
      "Fé você não precisa justificar. A constituição nos Direitos Humanos define que todas as pessoas têm direito a uma fé, desde que não transgrida ou agrida os outros cada um tem a sua fé. No entanto, é diferente porque a fé religiosa não precisa ser demonstrada, você acredita em Deus e não precisa provar que Deus existe, enquanto que a ciência você precisa provar. Além de provar, para ser um fato científico, ele tem que acontecer toda vez que você repetir o experimento. O cientista por ser cientista, respeita o direito do outro acreditar sem provas, porque a fé não exige prova. Mas, em relação aos fatos científicos tem que insistir. Este é o caso da Evolução, que em alguns lugares dos Estados Unidos foi proibido ensiná-la. No entanto, evolução é um fato científico. Existem inúmeras demonstrações científicas mostrando que realmente as espécies se modificaram, que as espécies de animais e plantas não são as mesmas que existiam no passado." (fonte oral).
      Depois de conhecer o ponto de vista dos entrevistados em relação à religião, percebemos algumas características interessantes no que diz respeito às verdades construídas ao longo das profissões: jornalistas e cientistas. Fátima Trombini, por exemplo, expressou a concepção de uma católica que tem a religião como um amparo, já Adriane compreende religião como uma instituição que usa o ser humano. Em contrapartida, Erlei, mesmo sendo cientista, relaciona-se de forma tranqüila com religião e ciência, diferente de Maria Irene, que compara religião com fé, dizendo que esta não precisa provar apenas acreditar.
      Diante de receptores ativos, que trazem em sua bagagem diversos cenários, interpretações, orientações entre outras peculiaridades individuais, perguntamos como percebem a divulgação de fatos e notícias científicas produzidas pelos meios de comunicação?
      Fátima analisa que no momento que surge uma descoberta nova há divulgação:
      "os jornalistas conversam com a igreja, comunidade, médicos, entretanto, depois fica tudo quieto até fazerem a primeira aplicação. A classe médica, por exemplo, mantém sigilo até o momento de pôr em prática. Embora os cientistas mantenham segredo absoluto de seu estudo, eles não conseguem esconder muito tempo da imprensa. Sempre tem comentários que acabam caindo nos ouvidos de um jornalista e aí o fato torna-se público. " (fonte oral).
      Segundo Erlei, no jornal há bastante distorção de fatos científicos: "é claro que têm exceções, uma vez que distorção depende da pessoa e não do jornal. Eu te dei o exemplo do Ivaldino Tasca. Agora, depende da confiança, se você desenvolvê-la com os pesquisadores vai longe." (fonte oral).
      Na concepção de Adriane, têm jornais que não dão espaço para divulgação científica, entretanto, tudo depende da linha editorial de cada veículo, assim com do público também. Mas, "acho que a ciência é pouco popularizada, porque estes avanços e estudos têm que chegar às pessoas simples." (fonte oral).
      Por outro lado, a cientista Maria Irene considera:
      "que a ciência se tornou empresarial. Até relativamente, algumas décadas atrás a distância entre um cientista e os resultados, em relação à aplicação daquilo que ele descobria, era tão grande que o cientista poderia ser comparado com um monge. Da mesma forma que um monge medita em sua religião, o cientista também ficava trabalhando para descobrir a natureza das coisas. Hoje, existem descobertas que não levam três meses para serem usadas. Por isso, o significado da ciência na economia é cada vez maior. Aí, você descobre as plantas transgênicas que vão modificar totalmente o reinado da química, sim, porque a física e a química mandam na tecnologia. Basta ver os celulares, os satélites e remédios, enfim, toda esta parte de produtos industriais. Agora a Biologia e a Genética estão emergindo para mudar totalmente o poder econômico. Quem domina a Biologia vai dominar a economia." (fonte oral).
      Jornalistas e cientistas produzem conteúdos jornalísticos e científicos, por isso são profissionais envolvidos diretamente com o jornalismo científico, porém, ao mesmo tempo, atuam como receptores, estando no lado inverso da emissão de fatos e acontecimentos da ciência. Nesse sentido, elaboramos a seguinte questão: se eles – como receptores ativos – percebem a produção científica dos meios de comunicação?
      A respeito deste questionamento, Fátima Trombini afirma que:
      "dificilmente leio artigo médico porque não entendo, assim prefiro buscar outros materiais que desmistificam a ciência como a revista Isto É, por exemplo. Também considero que mesmo a televisão, meio de comunicação de massa, não transmite de forma clara assuntos científicos que estejam incluídos no noticiário geral. Por outro lado, a televisão a cabo produz documentários e reportagens interessantes em programas especiais. Mas volta e meia aparece uma palavra complicada. E não há quem entenda, aí vamos procurar o significado através dos livros ou pessoas que tenham mais informação sobre aquele assunto. Muitas vezes, isso acaba tirando o interesse do programa." (fonte oral).
      O cientista Erlei Melo Reis, por gostar da ciência disse que assiste a Discovery Channel:
      "este canal é uma coisa de louco! Este ano, por exemplo, se discutiu muito os transgênicos no Brasil, então onde aparecer o nome transgênicos eu procuro ler. Outra coisa, existe na sociedade um processo que chama-se percepção seletiva. Nós só vemos, nos dirigimos ou damos atenção para aquilo que nos interessa e que temos um bom conhecimento. Então, por exemplo, eu sou um cara que só vejo doença de planta. Certo? Eu tenho a percepção seletiva direcionada para aquilo que for Ciência Agrícola. Outra coisa, você sabe que hoje é difícil acompanhar toda informação gerada, então, temos que filtrar." (fonte oral). 
      Nesta resposta, quando o cientista fala em percepção seletiva, observamos claramente a influência dos "supertemas", explicados por GOMÉZ no segundo capítulo, como temas prioritários que estão envolvidos com educação, trabalho, política, economia, sexualidade entre outros. Segundo ele, os "supertemas" servem como referentes e como filtros das mensagens que nos são relevantes.
      A jornalista Adriane, ainda respondendo esta questão, percebe a fonte utilizada pelo veículo de comunicação.
      "Vale você perceber os detalhes das fontes, por exemplo, se for no rádio percebemos que a pessoa se expressa bem verbalmente. Em pautas abordando os transgênicos, o jornalista precisa saber o que tem de novo. Acho interessante ouvir não só os dois lados, mas os três, os quatro, os cinco, porque têm inúmeros lados. Cada vez mais a opinião do consumidor e do público é importante. A gente como jornalista, tem que se pôr no lugar do consumidor, do público." (fonte oral). 
      Já Maria Irene conta que houve uma mudança no início da década de 90, quando a ciência começou a ser levada para mídia.
      "Eu acho que isso é importante porque traz informação para sociedade. Agora é como eu disse. Para se ter uma idéia, a revista da FAPESP no ano passado, publicou que em função da Biotecnologia, todas as grandes químicas estão se organizando, então uma compra a outra e se fundem. Só um destes conglomerados tem orçamento anual maior do que o PIB (Produto Interno Bruto) de 143 países. O poder realmente se deslocou dos governos, da política para estas grandes organizações econômicas. Antigamente, tínhamos guerras entre os países, os exércitos, as armas para disputar poder, território e controle. Hoje não, o poder está sendo disputado em outro nível, não é mais vender arma, mas é mercado para vender produtos." (fonte oral). 
      Voltando à questão, ainda abordada no primeiro capítulo do presente trabalho, o jornalismo científico consegue atravessar a ponte e aproximar ciência e sociedade?
      Conforme Fátima, mesmo havendo dificuldades na linguagem e na relação entre jornalistas e cientistas, o jornalismo científico leva informação para sociedade, que paga impostos e precisa saber o que acontece no mundo da ciência.
      De acordo com Erlei, o jornalismo consegue aproximar as duas áreas, porém depende só da pessoa. "Depende do jornalista, pois se tiver bom relacionamento, ética, educação e tática, conquista mesmo aqueles pesquisadores enclausurados." (fonte oral).
      Para Adriane, há ligação entre ciência e sociedade propiciada pelo jornalismo:
      "Porque mal ou bem, a gente sempre está vendo coisas novas sendo divulgadas. A Internet, por exemplo, expande assuntos de cunho científico. Hoje está usando um bom espaço, no entanto, não ameaça outros meios em virtude de não ser ainda popular, mas na Internet você tem tudo: vê, ouve, lê, tem como participar de discussões e debates." (fonte oral). 
      Segundo Maria Irene, "acho que está conseguindo em vários países, mas no Brasil está atrasado, ainda tem que se desenvolver mais. Aqui em Passo Fundo, na UPF, existe um espírito muito bom de interação entre pesquisa e divulgação." (fonte oral).
      No primeiro capítulo, explicamos o significado da "torre de marfim" para abrir as portas e destrancar todo o conhecimento ali fechado a "sete chaves". Além de desvendá-la ao público, entramos no "calabouço" onde existe dois indivíduos receosos em trocar palavras devido as diferentes línguas faladas no jornalismo e na ciência. Mas, o que realmente é "torre de marfim" para os entrevistados? Porque os cientistas se enclausuram para fazer ciência?
      Diante da existência da torre, a jornalista Fátima entende que os cientistas se enclausuram para estudar. Segundo ela:
      "Eles ficam no último andar pesquisando. São um pouco loucos, nós também somos, mas eles são mais! Têm alguns que sobem no topo da "torre" e não conseguem manter um elo de comunicação com a sociedade que está fora. Como se estivessem na ‘bola de ar’, ninguém chega perto." (fonte oral). 
      Fazendo o contraponto, o cientista Erlei afirma que:
      "esta expressão significa primeiro o medo de se expor. Você pode ser um bom gerador de tecnologia e conhecimento, mas se não participa de congressos é porque tem medo e se não publica é o mesmo reflexo deste medo. Então, todo pesquisador em sã consciência não pode se enclausurar, tem que estar aberto ao diálogo e se apresentar. E a onde? Qual o nosso fórum de debate, a onde nos apresentamos? Em congressos científicos da área e através de publicações. Eu conheci pesquisadores na minha vida profissional, que trabalharam mais do que eu em tempo, mas nunca publicaram nada e nunca foram a um congresso. E se perguntavam sobre seus dados, se vai ser útil a sociedade ou a ciência mundial, ele dizia: depois eu vou publicar isso aí. Eu chamo isso de uma geração perdida. Se você é um pesquisador e se enclausura, então é inútil à sociedade. Eu diria que esta pessoa não tem vocação. Nós, como humanos, não podemos ser inúteis à sociedade, afinal, a história, a ciência são o desenvolvimento de uma comunidade." (fonte oral). 
      Entretanto, Adriane considera que "é um tipo de escudo para o cientista se defender. Esta "torre de marfim" existe e é bem grande, bem alta. Eu acho que é por causa do estrelismo, é uma forma do cientista se bitolar. Na minha opinião, tudo que você sabe deveria pôr para fora." (fonte oral).
      A pesquisadora Maria Irene entende que a "torre de marfim":
      "tem a necessidade da solidão e da concentração, você precisa realmente de isolamento para se concentrar. Agora entendo "torre de marfim" como uma espécie de proteção que o cientista usa para não se sentir muito agredido pela realidade, porque na medida em que ele entra neste mundo que é o mundo da lógica, verdade e racionalidade, é difícil conviver com a realidade. Por outro lado, acho que a "torre de marfim" permitiu que grandes descobertas fossem feitas e que a sociedade se beneficiasse através das tecnologias e inúmeros progressos. Se estas pessoas não tivessem se afastado para tentar desenvolver estes trabalhos talvez a ciência não teria progredido tanto. Então, é uma contradição entre ser um bom cientista e um ser humano." (fonte oral). 
      O relacionamento jornalista e cientista foi discutido no Guia Prático para "Camelôs" e "Bailarinas" – Debate sobre jornalismo científico, quando Flávio DIEGUEZ, editor de Ciência e Tecnologia do Guia Rural da Abril definiu a relação jornalista e cientista como "rabugenta". Ele justificou dizendo, "que você pode ligar para um cientista e ele dizer: "não tenho tempo para falar com jornalista". Essa é uma atitude elitista, pois não ajuda a aumentar o número de pessoas que dominam o conhecimento, ao contrário, só serve para reforçar a ‘torre de marfim’ em que alguns gostam de viver. "Há uma diferença entre o tratamento da imprensa por um cientista no Brasil e em países da Europa, por exemplo. Lá o cientista arranja tempo e até faz questão de procurar o jornalismo para levar seus conhecimentos ao grande público. Eles sabem que essa atitude lhes dá melhores condições para obter mais verbas. No Brasil isso não funciona." (DIEGUEZ, 1989, p, 19).
      O jornalista Júlio ABRAMCZYK sugeriu uma forma de melhorar o relacionamento entre jornalistas e cientistas: compreensão e respeito mútuos. Para ele, o jornalista científico deve falar e entender a linguagem do cientista, ao mesmo tempo, que o cientista deve reconhecer que uma matéria para audiência não é um trabalho científico.
      Nesse aspecto, harmonizar a relação entre os dois profissionais seria um passo para melhorar a divulgação científica.
      Fátima acredita que se o jornalista se informar e o cientista se abrir a divulgação da ciência, certamente, crescerá. (fonte oral).
      Na opinião de Erlei Melo Reis, "não depende só do jornalista profissional com curso e especialização científica, uma vez que depende do caráter da pessoa. A universidade e especialização ajudam muito, mas vocação para trabalhar com ciência e jornalismo depende da índole da pessoa." (fonte oral).
      Já Adriane Bertoglio Rodrigues pensa que é preciso "ter ciência do assunto". (fonte oral).
      Por último, a cientista Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes volta a insistir na especialização, no entanto, diz mais:
      "existe um termo usado pelos filósofos que falam em cientista anfíbio, porque ele trabalha em duas áreas. Por exemplo, filosofia e genética, disciplinas, aparentemente, diferentes, mas que integradas permite uma visão diferenciada quando se tem formação nas duas áreas. A biologia e física, você tem a biofísica, a bioquímica. Quando usa o método de duas disciplinas para tentar conhecer melhor a natureza das coisas, vejo a importância de uma especialização entre os jornalistas. Eu acho que os jornais precisariam ter vários jornalistas especializando-se em diversas áreas, porque o conhecimento aumenta num ritmo muito veloz." (fonte oral).  
      Os entrevistados foram unânimes em atribuir à jornalistas e cientistas responsabilidades fundamentais para que a divulgação da ciência melhore e a "torre de marfim" possa ser local de fácil acesso aos olhos da sociedade.

      CONCLUSÃO

      Estamos saindo do interior da "torre de marfim". Ao olharmos para trás, percebemos que a cada degrau aumentava a distância entre o conhecimento e as pessoas comuns. Chegamos ao topo, mas sem compreensão era difícil se aproximar das cabeças pensantes que produzem ciência. Agora que a observamos de fora, desejamos viabilizar mecanismos que integrem ciência e sociedade. Acreditamos que o jornalismo científico torna a complexidade científica mais acessível e simples ao público.
      Embora haja conflito entre jornalistas e cientistas, como diz Wilson BUENO, ele deveria ser superado pela necessidade que ambos têm de democratizar o conhecimento científico, fundamental para que o cidadão entenda o mundo em que vive.
      Portanto, estabelecer um elo entre ciência e sociedade, como já vimos, é tarefa primordial do jornalismo científico e como constatamos ao longo do trabalho, especialmente na análise desenvolvida no terceiro capítulo, totalmente possível quando jornalistas se especializarem e cientistas saírem da "torre de marfim". Entendemos que a expressão - utilizada pelo senso comum – significa, segundo a fonte oral Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes, momentos em que o cientista precisa da solidão para concentrar-se no desenvolvimento da pesquisa científica. A existência da "torre de marfim", também é explicada por ela, como forma do cientista proteger-se da realidade, tendo em vista que o mundo racional e lógico da ciência, muitas vezes, torna difícil sua convivência com o mundo real.
      Por outro lado, há cientistas que enclausuram-se dentro da "torre de marfim" e dali não sentem necessidade de sair, mesmo sabendo que o recurso financeiro para pesquisarem advém de impostos pagos pela sociedade. Para alguns, é inadmissível descer do topo para conversar com jornalistas desinformados.
      Mediante as respostas colhidas de jornalistas e cientistas entrevistados no desenvolvimento do trabalho, torna-se clara a visão que um tem do outro: o jornalista sente-se inferiorizado diante do cientista.
      Neste sentido, as profissionais da comunicação Fátima Trombini e Adriane Bertoglio Rodrigues destacam o receio de entrevistar um pesquisador. Conforme elas, o cientista não vai saber expressar em breves e simples palavras o que estão pesquisando. Aí, está o problema. Em contrapartida, o cientista que passou meses trabalhando, estudando sobre aquele assunto, sente dificuldade em entender a abordagem que o jornalista dá à matéria.
      Assim, os cientistas Maria Irene Baggio de Moraes Fernandes e Erlei Melo Reis lembraram situações complicadas onde jornalistas deturparam aquilo que disseram em entrevista. Realmente, ter o nome vinculado à matéria distorcida no jornal é comprometedor. Por isso, nós jornalistas devemos nos pôr no lugar da fonte, no caso os cientistas, para perceber o receio que sentem quando erramos ou interpretamos mal uma informação.
      Além de conhecer os conceitos de jornalismo científico e conversar com pessoas relacionadas à área, fomos mais a fundo na questão de entender sua recepção em relação às mensagens dos meios de comunicação, relativas à ciência.
      A princípio não foi fácil abstrair a teoria da recepção, a qual elaboramos o segundo capítulo do presente trabalho. O desafio foi constante e, ao mesmo tempo, satisfatório, tendo em vista o conhecimento aprendido no decorrer da monografia.
      A respeito da recepção, entendemos que os dois autores estudados fazem uma crítica à investigação quantitativa que não trata o receptor como ativo, pois não leva em conta as individualidades, relações sociais, culturais e históricas daqueles que estão diante dos meios de comunicação. Entretanto, o processo mais complicado foi estabelecer uma conexão entre teoria da recepção com jornalistas e cientistas. Felizmente, conseguimos relacionar suas diferentes opiniões acerca da ciência e jornalismo cientifico.
      Neste sentido, concluímos que para estender o conhecimento produzido pela ciência à sociedade, os jornalistas precisam saber previamente sobre os assuntos científicos quando forem entrevistar um cientista. Portanto, ressaltamos que a especialização é inevitável para que o jornalista compreenda a linguagem usada na ciência, e assim, possa traduzi-la à audiência.
      Desta forma, sugerimos a inclusão de um quesito ou projeto dentro dos institutos de pesquisa que responsabilizasse os cientistas a divulgar a ciência nos meios de comunicação de massa, que são os veículos que chegam ao grande público. Caso contrário, o conhecimento científico ficará restrito a uma minoria elitista. Esse, sem dúvida, não é o papel do jornalismo científico, portanto, vamos colaborar para que o conhecimento continue desenvolvendo as sociedades humanas.

      REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, Rubem. Filosofia da ciência – introdução ao jogo e suas regras. 16ª ed. Brasiliense, 1992

GOMES, Pedro Gilberto; COGO, Denise Maria. O adolescente e a televisão. Porto Alegre: Editora Unisinos, 1998.

LAGE, Nilson. Linguagem Jornalística. São Paulo: Ática, 1993.

LYRA, Paulo (org). Guia prático para "camelôs e "bailarinas". Debate sobre jornalismo científico. Brasília. Secretaria Especial da Ciência e Tecnologia. 1989.

MAIA, Newton Freire. A ciência por dentro. 2 ed. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1992.

MARQUES José de Melo (org). O artigo científico. Revista Brasileira de Ciências da Comunicação. 1999.

Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, CONCITEC (org). Jornalismo Científico. I Encontro Paranaense de Jornalismo Científico. Curitiba: 1989.

In: ZIMAN, J. M. Conhecimento Público. São Paulo: Edusp, Belo Horizonte, Itatiaia, 1979.

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OBS: Monografia apresentada como conclusão do curso de Jornalismo na Universidade de Passo Fundo/RS, sob a orientação da profa. Sônia Schena Berthol, em novembro de 2.000.

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*Endil Tamara de Melo é bacharel em Jornalismo, com interesse específico na área de Jornalismo Científico.

 
 
 
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